terça-feira, 20 de julho de 2021

Mal olhado uma ova.

Eu me lembro bem de algumas das melhores coisas da minha infância. 

Brincar até tarde na rua, era uma delas. 

Tomar banho no horário estabelecido pra não levar “guardada de jaca” da mãe, era o que garantia o alvará.  Pois logo em seguida, podia-se pedir para ficar mais um pouquinho com os amigos, pelo menos até o jantar.

Mas tinha uma condição.  Após o jantar era “de lei” ir pra sala ver TV em família.  Eu podia até jogar algum jogo de tabuleiro com meu irmão ou mesmo ler um livro, desde que ficássemos todos juntos.  E era muito bom.

Assim, seguir a programação da TV virou algo costumeiro e acompanhar novelas, bastante comum.

Algumas ficaram tão gravadas que hoje sou capaz de dizer em qual época passou tal novela e em que casa eu morava. 

As primeiras da Tupi eram ótimas.  Vitória Boneli, As pupilas do senhor reitor, A rosa dos ventos, A viagem, Mulheres de areia, Ídolo de pano e por aí vai. Depois, foram as da Globo.  O astro, Selva de pedras, O casarão, Pai herói e o Bem amado.

Não sou mais noveleiro.  Claro, a gente cresce em todos os sentidos.  Veio a puberdade com outras distrações e  o aprofundamento nos estudos com suas obrigações e deveres que eu adorava fazer após o jantar. Daí pra adiante foi o desenvolvimento natural e a consequente libertação da TV que então deixou de ser importante. Graças a Deus.

No entanto, algumas coisas nas novelas daquela época me marcaram profundamente.  Principalmente aquelas que mostravam vilões que conseguiam interferir no dia a dia das pessoas, manipulando suas vidas por trás ou criando um ambiente infernal no seu entorno.  Os personagens vítimas eram sempre os últimos a saber. Óbvio.

Criando “verdades” de maneira escultural, essa mulher ou homem, um ser mal-intencionado, se travestia de bom amigo, irmão ou parente leal, mas no fundo vivia promovendo armadilhas para sabotar alguém, seja por inveja, concorrência, interesse ou mesmo maldade pura.

Tinha vítima que abria mão do amor da sua vida ou deixava pra trás grandes amigos por crer nas mentiras bem arquitetadas pelo crápula.  

Por outro lado, havia também vítimas que perdiam a sua própria credibilidade e o respeito das pessoas que compravam a versão pregada pelos vilões de duas caras.  Com sua reputação destruída, esse coitado ou coitada passava a ser tido por ladrão, desonesto, traidor, ou qualquer outra coisa que o valha.  Era destruído aos poucos sem sequer imaginar. Sempre ingênuo, caia em arapucas que apenas confirmavam as histórias que dele eram fabricadas por essas mentes malfazejas.

Presente na maioria dos enredos de então, aquilo me deixava indignado, mesmo eu sendo ainda moleque.  Pra meu sossego, felizmente, havia o benefício de pensar que tudo fazia parte da trama televisiva, mas que jamais aconteceria na realidade.

Ledo engano.  Basta viver para ver como a vida imita a arte.

Se alguém arruma um grande amor, se alguém se dá bem na carreira ou ainda se recebe uma promoção, um prêmio ou se simplesmente é bem-quisto pelas pessoas à sua volta, isso incomoda tanto a uma figura ruim que, essa pessoa disfarçada de gente boa, generosa, humilde, coitadinha, fará de tudo para destruir a vida desse seu desavisado desafeto.

E o pior, por incrível que pareça, os maus feitores conseguem êxito e o alvo de seu ódio vira bandido.  É perseguido, detestado, desprezado, demitido, apelidado, repudiado e desacreditado.  Perde seu valor e torna-se um pária, sem imaginar como ou por quê isso aconteceu. Se duvidar, como fica isolada, essa pobre alma acaba por se aproximar ainda mais de seus algozes que por fingirem bem, até a consolam e recebem sua confiança e apreço cada vez mais.

Com o advento das redes sociais, parece que esse tipo de comportamento piorou muito.  

Como alguém não pode saber o que é comentado de si nos grupos secretos de WhatsApp, que também servem de submundo de covardes e mentirosos, há o risco de acabar por confirmar maldades lhe dedicadas quando inocentemente publica em suas páginas e perfis pequenas conquistas ou bons momentos de sua vida.  O simples sinal de felicidade ou um sorriso leve, instantaneamente alimentam a ira de quem já está envenenado.

Triste, mas já vi ser chamado de “picareta” alguém que jamais se locupletou de qualquer coisa alheia, ou que jamais "passou a perna" em alguém.  Também já vi ser tido por espertalhão alguém que sequer aplicou qualquer golpe.  

Atacado por gente de caráter defeituoso, tem quem seja tomado por mentiroso, fofoqueiro, sem muitas vezes nem se importar com vidas alheias ou sem jamais contar intimidades de quem quer que seja.

Construir uma imagem é muito difícil. Todo mundo sabe.  Leva tempo e vivência.  Mas destruir uma é simples.  Basta posar de bonzinho e falar horrores de alguém.  A maledicência ganha adeptos rapidamente.  

Há quem acredite ser vítima de "mal olhado", macumbas ou demandas.  Mas na verdade o problema é estar perto de gente que, pra ser feliz, se escora no outro e vive a desgastar ou fazer sofrer aquele que escolheu pra vampirizar. 

Olha, não há o que se fazer nessas horas. Talvez, esperar passar.  Quanto mais mexe, pode ser pior.

É preciso lembrar que somos imperfeitos, todos nós e que estamos na Terra para a chamada evolução.  E essas pessoas complicadas, invejosas ou doentes de alma, também vão melhorar.

O recomendado mesmo é se cuidar sempre.  Crescer em silêncio como as flores, que quando são notadas, já desabrocharam.  Não fazer muito alarde daquele momento de grande alegria. Não propagar projetos que ainda não se concretizaram.  Conquistas como crescimento pessoal, financeiro e mesmo a felicidade, causam revolta nos mal-amados sobre a Terra. Uma pena, mas fato.

Démodé, a vilania devia ter ficado apenas no mundo das telenovelas de antigamente.  Afinal, as modernas estão mais para cenas grotescas. Já na vida real, ver coisas assim faz parte do contexto de um mundo em que os egos são mais valorizados que espíritos e almas. Compreender isso, judia menos da gente.  Relevar e fugir dessa balbúrdia, pode facilitar a paz interior e manter a afeição dos outros intacta.

2 comentários:

  1. Como sempre, o conteúdo é interessante e vale a pena ler e refletir. Parabéns ao Carlos Alexandre pela sabedoria e compartilhamento.

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