terça-feira, 7 de setembro de 2021

Da estiagem à independência.

O período é de uma seca sem igual.  Eu, particularmente, não me lembro de uma estiagem tão prolongada e tão devastadora quanto essa. Perdi a conta do tempo em que estamos sem uma chuva de verdade.
Rios baixos, plantas morrendo, poeira por toda a parte e ar sem umidade.  Acho mesmo que a Terra, pelo menos nesse quinhão onde me localizo, está definitivamente se transformando em um grande deserto. 
Já me falaram que aqui, no interior de São Paulo, não chove nos meses que não trazem "r" no nome.  
Mas a escassez não é só de água. A danação é a escassez de consciência, de um mínimo de responsabilidade e bom senso por parte de uma fatia da população desse país, que insiste em defender o indefensável.
Ocupado com afazeres pessoais dos últimos dias, havia me perdido das notícias, vídeos e tantas outras informações acerca da política nacional que sempre gostei de acompanhar.  
“Refazedor” em amplos sentidos, meu final de semana me proporcionou entrar em contato novamente com os canais que sigo e tomar conhecimento de vários comentários nas redes sociais.
Me deparei com coisas risíveis e outras nem tanto.
Aliás sobre isso, antes de mais nada, quero salientar que pouco me importa a questão moral que envolve a vida afetiva do presidente.  “Corno” ou não, o fato é sua conivência e contribuição em um processo escandaloso de peculato a ser investigado mais a fundo e punido rigorosamente afim de registrar, de vez, que Bolsonaro jamais esteve alheio às rachadinhas ou a qualquer outro ato de corrupção praticado pelos seus cônjuges, filhos e protegidos.
Também não me causa interesse as afirmações de Maia quanto a orientação sexual do Bozo. Como presidente da Câmara dos Deputados que era, ele então devia ter apresentado, enquanto podia, os muitos pedidos de impeachment que recebeu contra o presidente e manteve engavetados.
Essas coisinhas acabam, ainda que involuntária ou indiretamente, por apequenar a gravidade do momento, que consiste nas ameaças dirigidas às instituições de poder e seus representantes, feitas com total clareza e desinibição.
Iniciadas pelo próprio inconsequente que habita o Alvorada é repetida pelo seu séquito de perigosos descerebrados sem a menor cerimônia. Alguns vão muito além do exagero a ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal de morte.
Bolçonaro, acuado por um mar de acusações contra si e seus filhos, não consegue se concentrar em mais nada. Por isso convocou seguidores para manifestações de rua no simbólico 7 de setembro. Inflamou gente maluca com seus impropérios.  Gerados por uma competente maquinação cibernética, esses cordeiros, não só se encaminham para o cumprimento inquestionável das ordens de seu “mito”, como contribuem financeiramente ou por meio de postagens que exibem, sem filtro, a ignorância do que apoiam.
Nesse cenário que acaba por vexatório, estamos diante de um golpe anunciado, embora improvável, que pra vergonha de todos nós, fica como está, sem qualquer outro tipo de reação ou atitude, seja por parte do Judiciário (mais atacado), seja das tímidas lideranças políticas do país. Uma ressalva para as atitudes corajosas e precisas do Ministro Alexandre de Moraes que não tem dado descanso esses agentes do caos.
Com relação às pretensões do presidente, ficamos observando de um lado as Forças Armadas e os muitos militares das polícias estaduais que nos são ainda uma grande incógnita, sobretudo por conta de certa divisão que ainda se vê nos quartéis. Por outro lado, nem devíamos ter esse tipo de dúvida. Servidores públicos cuja função é a garantia da democracia e a defesa da Constituição, já teriam por lógica sua posição nessa questão. Vamos ver.
Mas e aí?  O que nos cabe nisso tudo?  Ficar sentados em nossas salas de estar esperando o desfecho dessa aflição?  Assistindo as mobilizações de rua de ambos os lados e torcendo como quem segue um campeonato de futebol? Ou vamos também para as ruas reforçar nosso lado sem saber ao certo o que fazer?
Setores da esquerda conclamam para manifestação paralela como que a medir forças e inibir os pró governo no que poderia acabar em um perigoso confronto. Sempre valorizei os manifestos.  Mas há coisas a se lembrar aqui.
Primeiro que os autoproclamados “patriotas” do presidente, fizeram primeiro o chamamento para esse dia 7. Além disso, precisamos estar alertas para não “tocar tambor pra malucos” ou correr riscos desnecessários fornecendo instrumentos para os adversários.
Quem pode ter forjado uma facada, pode ir além. Puxemos na memória episódios inesquecíveis como o escândalo do Rio Centro. Devíamos ter aprendido que não se briga frente a frente com quem joga sujo.
Por isso, particularmente, penso que não é dessa maneira que mostraremos garra ou unidade. Negligenciar ou desfazer de tudo isso também não é alternativa. Fingir que está tudo bem e que o “cachorro morto não morde” não vai ajudar a trazer de volta o espírito fraterno de nossa combalida e dividida pátria.
Mesmo porque podemos ter uma oportunidade nesse cenário. Vai que conseguimos realizar o livramento, tirando de vez o auto imposto “rei” de seu trono.
Eu disse "auto imposto", mas será?
Dor, tristeza, morte, devastação, atraso e o ápice da corrupção, são resultados inefáveis que encontram, no autoritarismo dos tiranos, seu “adubo”.  A humanidade já viu seus tiranos de outrora.  Eles não chegaram em naves espaciais.  Nasceram entre sua gente e muitas vezes foram eleitos democraticamente. Foram alçados ao poder com apoio inegável.
Para nosso consolo ou esperança dos historiadores, no entanto, é também a partir das sanguinolentas tiranias, ou precisamente da revanche a elas imposta, que a civilização acorda para ações de lucidez que geralmente impulsionam para o resgate da liberdade e progresso.
Ainda assim, teria sido melhor que a semente da tirania bolsonarista tivesse perecido no seu brotar, sem a necessidade de tanta perdição. O atraso a que fomos submetidos pelo retrocesso desse desgoverno carecerá de décadas para ser subjugado.
Bolsonaro é desses tiranos eleitos.  Mas como isso aconteceu afinal?
Tudo começou, não custa repetir, por brasileiros terem dado ouvidos a um imbecil como Aécio Neves, que perdendo a eleição, recusou-se a aceitar.
Também tem culpa o segundo mandato de Dilma por não exigir da mídia que quase lhe causou a derrota, um compromisso com a verdade e principalmente depois por deixar figurinhas gananciosas como Temer e Cunha respirando no centro do poder com canetas nas mãos.
Por fim inclua-se a ingenuidade do povo que acreditou na “faxina” chamada Lava Jato que gerou, isso sim, um estrago sem tamanho no país. 
Seus promotores no Paraná, chefiados pelo falso “superman”, esculhambaram com a Economia brasileira aprofundando uma crise sem precedentes e assinada por Moro, Dallagnol e sua patota. 
Desde o golpe que nos tirou uma presidenta honesta até chegarmos aqui, não há o que contar de bom, de razoável ou de singelo que tenha valido à pena. Mas quem arquitetou esse golpe e que por esse intermédio nos legou Bolçonaro, acabou conseguindo o que queria.
Eles são os mesmos de sempre e que atuam na defesa de pesados interesses. São "despachantes do poder" que ocupam espaço no Legislativo aos poucos. Hoje, boa parte batizada de bancadas da bala, da bíblia e do boi. 
Votam suas leizinhas facilitam um negocinho aqui, outro ali e vão levando de governo em governo.
Vorazes, queriam avançar ainda mais. Então precisaram de um "laranja". 
Mesmo tendo tirado o principal oponente do rumo das urnas, não emplacaram nenhum dos nomes que tentaram construir. Foram então buscar uma pobre alma, estúpida o bastante para exaltar um torturador em plena "Casa do Povo".  Um “zero a esquerda”, membro do “baixo clero” e que jamais produzira qualquer coisa de útil.  
Inflado e encantado por esses "obreiros do inferno", Bolsonaro começou a demonstrar certo jeito pra coisa. A força maior veio de Bannon e dos mecanismos de comunicação por ele arquitetados.
Adorador dos Estados Unidos e deslumbrado pelo poder, o ex-deputado foi o alvo perfeito. Só não imaginavam que um dia lhes fugiria ao controle.
Esses monstros, disfarçados de bons cidadãos, possuem uma agenda e provavelmente a jogaram em Bolsonaro assim que eleito.
Há o grupo que defende a liberação das armas com a desculpa da proteção patrimonial enquanto que o que quer é garantir o domínio nos latifúndios.  Para um cara com possíveis ligações com a milícia carioca, liberar armas não custava nada e Bolsonaro pode até ter tido um enorme prazer em faze-lo.
Outra parte é composta por aqueles que dizem defender a liberdade religiosa, a família e os bons costumes. "Homens de fé" que desejam mesmo é continuar a explorar gente humilde e de boa vontade ensinando inclusive pelas rádios e canais de TV que para receber de Deus, antes é preciso doar para os CNPJs das igrejas. 
Por fim uma terceira turma salvaguarda das demandas do agronegócio. Não o agricultor da economia familiar, mas as grandes corporações sem compromisso com o combate à fonte, sem qualquer contrapartida na promoção de emprego e completamente adversária do meio ambiente.
Piores que Bolçonaro são esses que ainda precisam dele para distrair nosso povo.  Por isso seguem mantendo engavetados os pedidos de impeachment  enquanto se refastelam nos banquetes financiados pelo tesouro nacional.
Espalhando o medo e aversão ao comunismo, prometem que os pobres poderão usufruir daquilo que eles propagam, como outrora fizeram os conquistadores se utilizando de espelhinhos e retalhos de seda.
Sem escrúpulos, não se importam se com isso causam revolta contra um partido político ou contra um simples ativista como o padre Lancellotti.  Só querem que o povo se ocupe contra si próprio enquanto eles continuam sua ação devastadora nos corredores do Congresso.
E Bolçonaro?  Como um bobo da corte, é por eles permitido, suportado, enquanto ainda útil. Desprovido de bom senso, ele nem se vê como tal, acreditando mesmo que comanda o Exército, a Marinha, a Aeronáutica e as forças da natureza.
Extrapolando por culpa de quem o aplaude sem critérios do cercadinho todos os dias e pelos bajuladores (militares e civis que compõem sua corte), acredita-se capaz de comandar uma revolta sem precedentes. 
Exaltado ao extremo, ele quer dar seu grito de independência, livrando-se das amarras dos demais poderes e das ameaças iminentes contra si e seus filhos, suspeitos até os cabelos da prática de vários crimes.
Olha, temos uma oportunidade aqui. 
Quando Collor recorreu ao apoio popular, foi empurrado ladeira abaixo pelo povo
De repente, no caso de Bolsonaro é o que nos resta a fazer a partir de sua própria iniciativa.
Afinal, temos tudo para vencê-lo de maneira correta.
Uma constituição incrível, comunicações livres, tanto para suas mentiras, quanto para os esclarecimentos necessários e desnudar das FAKE NEWS.  Contamos ainda com o olhar do planeta que foi negligenciado pelo nosso presidente desde que assumiu.
Como vínhamos de uma boa relação com os outros povos, dá pra dizer que a Terra inteira está preocupada com nossa democracia.  
A exemplo de outros, como Trump, Bolsonaro pode ser defenestrado a qualquer momento e não haverá quem o socorrer.
Para tal, no entanto, não podemos ficar alheios. Não digo ir para o enfrentamento das praças.  Não hoje.  Só que devemos nos importar, conversar, estabelecer troca de impressões.  Devemos nos manifestar nas redes sociais, nos grupos de famílias e mesmo diante de amigos e clientes com quem muitas vezes evitamos o debate afim de não prejudicar as relações. Desfazer as névoas que encobrem as mentes e corações de tantos companheiros iludidos pela força de algoritmos a serviço do mal.  Precisamos fazer isso urgente, pois estamos agora tratando de liberdade, de modelo de vida, de futuro e de esperança.
Para nossa ação contundente, não faltam argumentos.
Temos um presidente que não fala em emprego, não fala em combate à fome, não fala em justiça social.  Não defende a educação. Menospreza o meio ambiente.  Deixou rasteiros e lobos controlando a saúde. Escarnece da cultura e das artes.  Briga e planta discórdia entre tudo e todos, dentro e fora do país.  Distrai as turbas enquanto o “vendilhão” da Economia atua a sequestrar as riquezas naturais nos muitos conchavos que esvaziam nossos cofres e celeiros.  E pra piorar, diverte e alimenta aluados de “boa vontade” que saem as ruas se achando patriotas a gritar por armas, intervenção militar e outras asneiras démodé e ilegais sob a gargalhada do “centrão” e suas bancadas da miséria.
O discurso dos defensores desse governo é uma reedição do modelo fascista, que vencido no passado, foi ressuscitado por falsos moralistas, fanáticos e doentes da alma.  Desse discurso não sobra um só pensamento em favor do Homem, da vida ou da harmonia. 
E poxa, no fim a data é propícia. 
Durante anos no 7 de setembro, ocupei com companheiros diversos os desfiles cívicos de minha cidade, mas não para exaltar a falsa festa da independência.  Fazíamos questão de invadir as fileiras e erguer cartazes para alertar contra as ações sub-reptícias que a cada ano liquidavam nossa soberania e os direitos dos trabalhadores.
Como independência não tivemos mesmo até hoje, quem sabe agora, o grito dos excluídos não se faz ouvido e mais alto que o reclame dos vorazes e cegos mantenedores da exploração que encontraram, na causa dos bolsonaristas, a distração que precisavam para alardearem sua podridão sem serem notados?
Se de uma só tacada, livrarmos o Brasil desse louco e da corja de legisladores que o alimenta, teremos concretamente motivos para festejar a independência
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