domingo, 14 de agosto de 2022

O HOMEM HOBBESIANO GOVERNADO PELAS PAIXÕES EM UMA BUSCA CONSTANTE POR PODER E SEU ESTADO DE NATUREZA.

 




Gabriel Gouvêa Gomes

Estudante de Filosofia
Universidade Federal de Uberlândia






Inicialmente, o antropocentrismo em Hobbes é essencial para a elaboração da obra Leviatã. Uma pequena introdução ao autor se dá por esclarecer certas características gerais de sua obra e conceitos. A primeira é que, o homem hobbesiano não é um homem racional e político por natureza. Tal afirmação revela muito sobre os caminhos de seu pensamento. Para Hobbes, o homem vai adquirir a racionalidade através da aprendizagem pela educação, costume, cultura etc. É possível notar aqui, um contraponto a filosofia Aristotélica. A primeira coisa que irá definir o homem Hobbesiano são as sensações. Hobbes afirma, que a natureza é a arte na qual Deus fez o universo, tal arte segue as regras divinas, gerando assim, movimento. O homem sente a natureza através das sensações e pelo o movimento que a natureza faz no corpo.

Pode-se entender então, que o movimento é algo muito essencial no pensamento Hobbesiano. Já que o princípio de autoconservação do homem é o que regula sua ação, e que autoconservação é conservar-se em movimento. Além dessas características, é necessário entender também o conceito de Leviatã. Um ser mitológico que representava os limites dos navegantes e marinheiros, aqui é a representação do estado. No qual representa um homem artificial feito pelo homem a sua imagem, de poder limitador, soberano e que defende seu povo.

Mas a Arte vai além ao imitar o mais racional e excelente trabalho da Natureza, o Homem. Pois, por meio da Arte, foi criado o grande LEVIATÃ chamado de estado, que não é senão um Homem Artificial que tem a finalidade de dar vida e movimento a todo o corpo. (HOBBES, 2015, P.13)

Continuando, na obra, o Leviatã vai ser representando como um homem máquina soberano formado de outros homens, no qual irá representar o poder absoluto. A coroa representa a monarquia, a espada representa a segurança, o cedro representa o poder soberano sobre o cumprimento do contrato e por fim sua altura é a dominação perante a cidade. Disto, Hobbes nos informará que o homem é o princípio e o fim da política, ou seja, a política deriva do homem. O homem é a forma, poder e matéria do estado. “Primeiramente, sua Matéria e seu Artífice; ambos são o homem.” (HOBBES, 2015, p. 14). Para entender mais sobre o Leviatã, Hobbes irá realizar uma profunda investigação filosófica acerca da natureza do homem.

Por conseguinte, Hobbes nos explica, que o homem tem um estado de natureza. Foi constatado que tal estado difere do de Aristóteles, aqui o estado de natureza do homem é a guerra. Uma sucessão de conflitos e competições.

Desse modo, se dois homens desejam a mesma coisa que, não obstante, não podem ambos aproveitar, eles se tornam inimigos; e cada um deles, na forma de seu Objetivo (que é principalmente a preservação de sua vida e, às vezes, somente seu próprio deleite), se esforça para destruir ou subjugar o outro. (HOBBES, 2015, P. 116)

Segundo Hobbes, os homens podem todas as coisas igualmente, diante isso, irão utilizar todos os recursos para alcançar seus desejosos “Portanto, se dois homens desejam a mesma coisa, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por ambos, tornam-se eles inimigos” (HOBBES, 2015, P. 115), ocasionando assim, um estado de natureza pautado em guerras e conflitos, diante das competições individuais. Portanto, os homens em estado de natureza, irão travar guerras para se sobre por a outros homens. “A partir disso, torna-se claro que, enquanto os homens viverem sem um Poder comum para mantê-los todos intimidados, eles viverão nesse estado que é chamado Guerra.” (HOBBES, 2015, P. 117).

Hobbes entende que, os homens por serem semelhantes tanto fisicamente quanto intelectualmente e por poderem todas as coisas de maneira semelhante, irão se impor uns aos outros através da violência. Hobbes nos explica que, os homens anseiam para sair de tal estado e que esse desejo se fundamenta em parte nas paixões. Tais paixões que inclinam os homens à paz são o medo da morte, o desejo necessário de se ter uma vida adequada e a esperança.  Diante disso, Hobbes diz que nós homens somos governados pelas paixões, através do uso da razão calculamos as consequências boas ou más das ações que visam a satisfação das paixões. Por isso, se torna necessário a existência de um poder forte e limitador para que mantenha os homens em ordem e fora de seu estado natural de guerra.

Em sequência, é de certa importância compreender que, o poder regulador não existe no estado de natureza. Ele virá existir a partir da criação do Estado e do contrato social. Por hora, precisamos esclarecer o porque do estado de natureza humana ser o de Guerra. Recapitulando, em primeiro lugar, os homens são governados pelas paixões e por meio do uso da razão, irão tentar satisfazer de todo jeito as paixões. Por poderem realizar todas as coisas de maneiras semelhantes, os homens travarão conflitos entre si sempre visando a realização de suas paixões, gerando um estado natural de guerra. De acordo com Hobbes, a guerra é uma consequência das paixões. Para entender a relação entre as paixões e a busca infindável de poder é necessário entender o que são as paixões.

Sucedendo, para Hobbes as paixões são movimentos voluntários de origem interna. Tais paixões ou movimentos, são duas: desejo e aversão. No qual o desejo, é o movimento que leva o indivíduo a aproximação do que o realiza. Já a aversão é o movimento contrário do desejo. No qual, o homem irá se movimentar afastando-se daquilo que o desagrada. No fim, as paixões sempre irão anteceder as ações humanas, sendo um forte expoente de algo que os motiva ou desmotiva.  

Quando esse esforço direciona-se para algo que o causa, é chamado de Apetite ou Desejo; este é o nome geral, e o primeiro fica muitas vezes restrito à significação de Desejo por comida, ou seja, fome e sede. E, quando o esforço direciona-se para evitar algo, é chamado de Aversão. (HOBBES, 2015, P. 54)

Pode-se notar então, o tom mecanicista da teoria das paixões em Hobbes. Ele irá se diferenciar muito do pensamento grego (Principalmente do aristotélico), felicidade para Hobbes, é movimento. O qual consiste na realização máxima dos desejos do homem. Pode se dizer, que a felicidade Hobbesiana é a satisfação ou realização máxima de seus desejos e a evitação total das coisas aversas e que causam aversão. Todavia, a felicidade amplia-se para além de tal afirmação. Pois, ela é também, dispor de tais meios da realização de tais questões, esse dispor de tais meios, é entendido como, Poder. A partir de agora, o desejo do Poder irá ocupar-se de grande parte da filosofia política de Hobbes. Relaciona-se a Guerra diretamente com a obtenção de poder. Pois, na sua eminente busca por mais e mais poder do homem (Para a realização e satisfação de seus desejos), é onde a maioria dos conflitos é ocasionada. Ocasionando, o estado natural de guerra. “O Poder de um Homem, tomando o conceito de forma Universal, são os seus meios atuais de obter algum bem aparentemente futuro e pode ser Original ou Instrumental” (HOBBES, 2015, p. 83).

Portanto, a relação entre a busca infindável de poder do homem, o estado de natureza como um estado de guerra e a teoria das paixões em Hobbes se dão por tais sequências fatoriais. É entendido e observado por Hobbes, que os homens são governados por suas paixões e não pela razão. As paixões são movimentos internos que diferem em desejo e aversão. Para o homem ter sua completa realização plena ou felicidade, ele precisa ter o máximo de realização ou satisfação de seus desejos e evitar ao total suas aversões. O meio para tal conquista é o Poder. O homem precisa de poder para realização de seus desejos, só que também, o homem sempre irá precisar de mais e mais poder. Ou seja, o poder atual, por maior que seja, é sempre insuficiente, pois como disse, Agostinho Ramalho Marques Neto, quem já teve aqueles meios e não os tem mais, não tem poder. Quem irá tê-los, mas ainda não os tem, não tem poder. Há, pois, nessa concepção de poder, um caráter temporal, que envolve necessariamente uma dimensão de atualidade. Resulta-se, a partir de toda a sequência de fatos a relação entre a teoria das ideias e a busca do poder com o estado natural de guerra. Pois, o homem sobre o comando das paixões e na intenção de satisfaze-la o máximo possível irá partir em uma busca constante de poder, essa busca incessável por poder é a grande originadora dos conflitos movidos por intenções individualistas. Por os homens serem semelhantes, eles sempre iram buscar poderes semelhantes, gerando assim, conflitos entre eles e tendenciando à um estado natural de guerra.

Bem como, tais afirmações geram uma solução para a questão do estado de natureza de guerra. O Leviatã, como dito antes, é a representação do Estado. No sentido figurado, o Estado vai ser representado por um grande monarca. Seu corpo, é formado por diversos homens que representam o poder limitador do estado sobre o homem, mas também, representa que a essência de todo o estado é o homem. O Leviatã tem como principais funções: a proteção de seu povo e um poder soberano, forte e limitador sobre os homens. Mas por que o homem irá criar o Leviatã e por que ele criaria algo com força soberana que limitaria o próprio homem? Conseguintemente, o homem então através do ato de Contrato Social, um acordo ou consenso entre homens, no qual os mesmos irão abrir mão de parte de sua liberdade que os tem em seu estado de natureza, fazendo assim, o Leviatã. “A transferência mútua de Direitos é aquilo que os homens chamam de Contrato” (HOBBES, 2015, p. 124) Um ser soberano, forte e limitador. Mas por que?  No Estado de Natureza, o homem possui liberdade e características naturais que nascem com ele, nas quais sabemos que se origina o estado de guerra sem fim. É importante lembrar-se que o princípio de autoconservação é o que regula todas as ações dos homens. Deste modo, a criação do Leviatã tem como primordial função a autoconservação do homem (posteriormente, o Estado Civil também irá se autoconservar).

Para um entendimento aprofundado, se dá por necessário um desmembramento das partes. Primeiramente, precisamos definir certos conceitos. O primeiro é o de Direito Natural: O direito natural é o direito que o homem tem de tomar tudo que suas forças, astucias e prudências conseguem para se autoconservar. “Consiste na liberdade de cada homem para usar seu próprio poder da forma que desejar para a preservação de sua natureza; isto é, de sua própria vida.” (HOBBES, 2015, P. 121). O conceito de liberdade é definido por Hobbes como aquilo que você pode fazer, tudo que está a seu alcance.

entendo, de acordo com o significado apropriado da palavra, ausência de impedimentos externos; tais impedimentos podem, por vezes, tomar do homem parte de seu poder de fazer o que quiser, mas não podem impedir que ele utilize o resto de seu poder conforme dito por seu julgamento e por sua razão. (HOBBES, 205, P. 121)

            Hobbes vai também definir a lei natural, como algo que obriga e limita as possibilidades de ações dos homens. “Lei Natural é um preceito ou regra geral fundada na razão, a qual proíbe o homem de fazer aquilo que seja destrutivo a sua vida ou que remova os meios para preservá-la” (HOBBES, 2015, P. 121). Então, conclui-se que é no estado de natureza, antes do estado civil que o indivíduo vai ter a maior liberdade possível. Certo, por que então o homem irá restringir tal liberdade com o Estado Civil, através do contrato social? Pois, apesar de o homem ter a máxima liberdade, ele encontra-se em uma situação de guerra constante. No qual o medo de perder sua vida é iminente. Logo, as paixões medo e esperança, movem o homem a utilizar a razão para calcular qual seria a melhor maneira de sair desta situação. Concluindo, que se há uma esperança de houver paz, o homem deve buscá-la. “Consequentemente é um preceito geral da razão: Todo homem deve se esforçar pela paz, na medida em que tenha esperança de chegar a ela; e quando não puder atingi-la, ele deve buscar e utilizar todo auxílio e benefício da guerra.”  (HOBBES, 2015, P. 122).

            Por fim, o contrato social surge como uma maneira de se alcançar a paz por meio do Leviatã. O desejo da paz é movido pelas paixões de esperança e medo, fazendo com que o homem utilize da razão para calcular qual a maneira de se encontrar a paz. A maneira vem com a criação de um Estado Civil, um estado forte e limitador, no qual os homens realizarão a transferência de parte de sua liberdade para o poder soberano que está acima de todos os contratantes. Entende-se, que o contrato social é um consenso entre os homens que abrem mão de parte de sua liberdade para a criação de um Estado Civil forte, soberano e limitador. Afim de realizar a autoconservação de suas vidas.

 

Referências Bibliográficas:

·       HOBBES, THOMAS. LEVIATÃ: OU MATÉRIA, FORMA E PODER DE UM ESTADO ECLESIÁSTICO E CIVIL. Edição Edipro, 2015

·       RAMALHO MARQUES NETO, AGOSTINHO. HOBBES E AS PAIXÕES. EMPÓRIO DIREITO. 2015. Disponível em: https://emporiododireito.com.br/leitura/hobbes-e-as-paixoes-por-agostinho-ramalho-marques-neto

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