quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

"E como as andorinhas, eu vim fazer meu ninho..."

 

Vítima de um calor mais agressivo que de costume, ao final dessa tarde, deitei-me em uma cadeira de descanso no quintal a fitar o céu, suplicante por uma nuvem que prometesse chuva ou o que o valha.
De repente, uma a uma, comecei a perceber a formação de um pequeno bando de andorinhas a sobrevoar meu "espaço aéreo".
Um sentimento de alegria bem grande tomou conta de mim, pois suscitou-me a esperança de que algo do passado iria se repetir.  Mas não.  Terminei frustrado, pois logo se foram e não passaram disso.  Um pequeno bando.
Muita gente, sobretudo nascida a partir de 1989, pode não saber, mas a cidade que hoje tem a capivara como mascote, já foi conhecida como lar adotivo de andorinhas azuis vindas do Canadá.
Isso mesmo.  Ano após ano elas saíam de sua terra natal em busca do calor de nossa região e encontravam nas duas praças principais de São José do Rio Preto, lugar para pousarem e dormir por seguidas noites durante praticamente quatro meses ou mais.
Ao final do entardecer, milhares ou milhões, nem sou capaz de precisar, vinham fazendo acrobacias incríveis pelo céu numa dança que durava quase meia hora, até descerem em grupos distintos nas árvores e por lá pernoitarem.


Ao amanhecer simplesmente partiam para as lavouras locais afim de caçar insetos, deixando pra trás a causa de seu desaparecimento.
Suas fezes fétidas, pintavam de branco toda a paisagem.  Era então necessário que a prefeitura providenciasse a lavagem das praças e calçadas do centro da cidade, o que fazia todas as manhãs. Claro, telhados e sacadas dos prédios, marquises de lojas e carros estacionados, se mantinham tingidos por mais tempo ficando sua limpeza aos encargos dos próprios proprietários.
Mas nem isso tornava menor a beleza ou o privilégio de tê-las adornando os céus do final do verão e do outono.  
Quando findava esse tempo, assim como chegavam, partiam para só voltarem no ano seguinte. E voltavam.
A população da cidade vivia dividida.  Os adoradores da natureza defendiam sua permanência.  Estudiosos de várias partes, pra cá chegavam afim de estudá-las. Turistas e até mesmo imprensa do Brasil todo, faziam fotos e escreviam sobre elas. Contudo, outra parte, sobretudo a de moradores da área central e comerciantes, insistiam por providências que pusessem fim a essas visitas.
Tanto fizeram esses que as árvores foram envenenadas, iluminadas, latões de óleo colocados sob elas, tudo para matar, expulsar e coibir seu retorno.
Por fim, nunca mais. O ódio venceu o amor.  O "comércio" venceu a beleza.  
Já sei que muitos não concordam comigo.  Afinal, vão dizer, não era eu quem tinha que sentir o cheiro.  Só pra salientar, minha mãe tinha uma loja de roupas femininas no centro da cidade.  Minha avó morava no prédio ao lado da Catedral.  Eu mesmo, muitas vezes, peguei o carro chamuscado, pra não dizer outra coisa.  Mas valia à pena.


Se fosse possível, e houvesse à época celulares como hoje, tenho certeza que muitos teriam feito vídeos aos borbotões.  Era barulhento, espantoso e sobretudo lindo.
Infelizmente não tenho nenhum filme para postar aqui.  Seguem então imagens tímidas e estáticas que não vão ilustrar, nem de perto, o que eram esses espetáculos.
Só espero que elas nos perdoem e quem sabe um dia voltem.  Podiam mesmo vir pra cá, na minha chácara.  Tenho poucas árvores, mas estão ao dispor delas ou de qualquer ave que queira descansar.


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