quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

A família e o Natal

"Família, família
Vovô, vovó, sobrinha
Família, família
Janta junto todo dia
Nunca perde essa mania"
(Arnaldo Antunes / Toni Bellotto)

Ronaldinho e Mel deram à luz Amora e Tokoloko (chamado também de Bily). A mãe mal comia enquanto amamentava e chegava a rosnar se alguém se aproximasse de seus rebentos. Até para fazer suas necessidades ela se demorava menos de 5 ou 7 segundos fora do ninho para não deixá-lo sem sua proteção.

Ronaldinho um spitz alemão e Mel uma yorkshire.  Seus filhotes ganharam uma aparência peculiar.  Mas hoje, moram separados dos pais.  


Alguém já parou pra pensar porque animais se desapegam tão fácil de suas crias assim que elas começam a se cuidar sozinhas, enquanto que nós humanos ficamos cada vez mais grudados com os nossos pais e filhos?

Um amigo chegou a me dizer que é questão de cultura.  Ele me falou que nos EUA por exemplo, se um jovem completa a idade de sair de casa e não o faz, seus pais sentem vergonha dos amigos e chegam a esconder o fato. Que frieza!

Já os latino-americanos, quase nos desfazemos em lágrimas quando um filho informa que vai "prestar faculdade" fora.  E tem gente, entre nós, que casa os filhos e insiste que continuem a morar juntos, um hábito cada vez mais usual. 

Eu sou muito apegado.  Quando o trabalho exigia vigem constante e para longe, eu me acabava de tristeza, saudade e consciência pesada, pois a cada lugar bonito ou diferente, me incomodava não estar ali com a família, sobretudo os filhos. Chorei ao assistir o Fantasma da Ópera na Broadway por não estar com os filhos.  Daí os levei e chorei por não estarem lá, os meus pais.

Por causa disso, aliás, acho que não dei voos mais altos.  Como fica evidente, além dos filhos, sou também bastante unido com os pais.  Em 2007 tivemos uma oportunidade fantástica de mudarmos de vez para Portugal, mas a somatória da chegada do filho caçula com os pais entrando na terceira idade, foram fundamentais para desistirmos.

Claro, não me arrependo.

Ficar junto, estar junto, vale qualquer coisa.  Momentos para se guardar na lembrança, no coração, na mente, ou mesmo na carteira e celular em forma de foto. E não importa quanto tempo dure esse estar junto.  Cada minuto, cada domingo ou cada jantar em família é bom demais.  Viver a família, pra quem ama de verdade isso é um hábito que só se aperfeiçoa. 

Me lembro de um tempo em que os natais eram muito esperados principalmente por mim.  Eu amava as luzes, cores, músicas, propagandas na TV e outras alegorias natalinas, mas era o reencontro com os primos que vinham de várias cidades e a noite longa na qual ficávamos juntos em casa de meus avós, o que mais me encantava.

Aquela casa cheia, mesa farta, abraços, orações e trocas de presentes, foi diminuindo com a idade dos avós e a perda de um deles.  Enfim, minha mãe e meu pai, mantiveram a tradição e logo transferiram para nossa casa as ceias.

E foram várias.  Uma maior que a outra.  Casa enfeitada de luzinhas, árvore de natal, mesa de frutas, de presentes, até fogos coloridos já teve.  Tios e tias, primos e primas, agregados de toda parte.  Amigos desprendidos ou distantes de suas próprias famílias a nos adotar como suas. Era tão legal que eu cheguei a pensar que isso não acabaria nunca. Mas sabe, com o tempo, tudo foi ficando muito complicado. Comemorar o natal em família agora é tímido, quase incomum. 

Talvez pelo consumismo desenfreado que foi tomando conta desse período.  Quem sabe ainda pela mistura de costumes e hábitos familiares diversos, em que alguns não celebram natal e outros não valorizam o estar em família. Existe, viu? 

Há também presente, em muita gente, um certo desprendimento da religiosidade que emoldura e reforça a celebração do natal. 

E não vamos descartar o que pode ser o mais fatal: a necessidade ou obrigação de trabalhar duro, cada dia mais, até quase a meia noite da véspera do natal. Quem tem fôlego, para comemorar coisa alguma, depois de um dia inteiro de trabalho pesado, ouvindo e lidando com centenas de pessoas vociferando atrás de um presente ou de um frango congelado?  Não sobra força, nem alegria, nem ânimo, nem fome, menos ainda vontade de sair de casa depois de um dia inteiro, ou muitas vezes, semanas inteiras de trabalho bem mais pesado que o comum.

Atrás de namoradas ou namorados, dividindo-se entre pais e sogros, ou mesmo sem dinheiro para viajar ou fazer festas, ou por ter trabalhado exaustivamente, esse tipo de encontro vem raleando. E agora, em tempos de pandemia, pode ser ainda pior, pois há um outro e forte motivo para não fazer festa. 

Sei lá.  Se não cuidarmos, esse "costume" pode desaparecer mesmo.  Mas a gente não pode deixar isso acabar. Nem que for para trocar mensagens pela internet na hora "H" ou quem sabe, fazer uma ceia no estilo "live".

Justamente por ver a COVID ceifando vidas, separando e destruindo famílias é que não podemos deixar de lado essa preciosa demonstração de afeto.

Com muita responsabilidade e amor, devemos prosseguir na insistência por estarmos próximos.  E auguro mesmo que possamos repensar agora os instantes no passado em que deixamos de estar juntos por conta de caprichos, pequenas brigas ou discussões, que hoje se mostram tão inexpressivos diante da impossibilidade de voltarmos no tempo.  

Enfeitar a casa de gente e perder menos tempo comprando presentes e comida, para gastá-lo melhor conversando ou revendo velhos amigos, familiares ou amores é o verdadeiro sentido do natal e da família em si. E com jeitinho, isso não vai matar ninguém.

Ah e tem mais, falando em matar, a gente é mesmo diferente de bicho.  Tão diferente que sabemos, acreditamos ou sentimos, que mesmo quem não está mais aqui, ainda está junto e sente quando a gente também está junto e sente.


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