quarta-feira, 23 de abril de 2025

Cardeal Dom Orani - no Conclave.

 

Imagem - Portal do Litoral

Dom Orani João Tempesta, Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro, é uma figura que transita com naturalidade entre os altares e os asfaltos, entre o silêncio das catedrais e o clamor das ruas.

Monge cisterciense de origem paulista, é um homem de serenidade nos olhos e firmeza no pastoreio, consolidou-se como uma liderança moderada, mas nunca apagada.

Prefere o diálogo à condenação, a escuta ao apedrejamento. No jogo político-eclesiástico, é visto como diplomata hábil, um articulador silencioso que causa desconforto tanto na direita (por recusar fundamentalismos) quanto na esquerda (por sua cautela estratégica, até demais). Mas talvez essa seja sua missão maior: ser ponte em tempos de muros.

Antes de assumir o Rio de Janeiro, Dom Orani já semeava transformações como bispo de São José do Rio Preto onde dirigiu a diocese de 1997 a 2004.

Chegou a uma diocese então adormecida e a despertou com um estilo pastoral único. A doçura monástica aliada à coragem evangélica.

Não era homem de discursos inflamados, mas de portas abertas e mãos estendidas.

Sob sua liderança, a Pastoral Social ganhou força, levando a Igreja para as periferias, não apenas geográficas, mas existenciais.

Ele acreditava que a fé, para ser autêntica, precisava descer do altar e ajoelhar-se no chão da vida, onde as dores e esperanças do povo se encontram.

Foi nesse espírito que nasceu o Grupo de Estudos e Ação Política (GEAPOL), iniciativa da qual tive a honra de participar ativamente, unindo formação política, cidadania e espiritualidade.

Na Vila Maceno, a Paróquia de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento (sob a direção do Padre Valdecir Dezidério) tornou-se GEAPOL, um centro de mobilização, inspirado pela Campanha da Fraternidade e pelo Evangelho vivido nas ruas.

Como coordenador da Pastoral Social ao lado de figuras como o Padre Jarbas Dutra, testemunhei como Dom Orani fez da diocese um espaço de serviço concreto. Sob sua liderança as Semanas Sociais foram devidamente praticadas e o Grito dos Excluídos ganhou as ruas.

Dom Orani nunca buscou holofotes. Sua força estava na coerência, sua coragem na ação discreta. Relativamente jovem para um bispo, ele nos transmitiu, na prática, que fé e transformação social são inseparáveis.

Hoje, no Rio de Janeiro, cidade onde o sagrado e o profano se entrelaçam nos morros e no samba , ele continua sendo costura em tempos de rasgão, tentando construir comunhão num Brasil dividido. E isso, em si, já é um milagre.

Gostaria que Dom Orani fosse ainda mais progressista e se alinhasse mais com as propostas da Igreja Avançada, mas nem imagino como seja a política interna nas altas camadas dessa instituição, apesar de Francisco, ainda lenta e reacionária. 

Mas confio nele e gostaria de vê-lo eleito no Conclave. 

Lembro que se emocionou profundamente ao se despedir do Papa quando de sua visita ao Rio de Janeiro, o que revela certa proximidade de pensamentos entre ambos, até porque foi nomeado cardeal em seu papado.

Gostaria de me encontrar com Dom Orani novamente para fazê-lo recordar sua passagem por Rio Preto. Não por nostalgia. Mas para lembrá-lo de que chamado, é para quem não tem medo da rua nem das missões. Que a revolução muitas vezes começa no silêncio e aceitação de quem serve. O que ele, pelo menos enquanto esteve aqui, provou. 


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