domingo, 20 de abril de 2025

O Acordo Histórico da OMS e os Desafios da Equidade Global no Enfrentamento de Pandemias

 

Imagem: O Globo
Em um momento marcado por divisões geopolíticas e crises de financiamento, a Organização Mundial da Saúde alcançou um acordo histórico sobre um novo marco global para preparação e resposta a futuras pandemias.

O pacto, juridicamente vinculante, estabelece diretrizes para que o mundo enfrente futuras emergências sanitárias de forma mais coordenada e justa. No entanto, o caminho até essa conquista foi permeado por tensões, especialmente em torno de um dos pontos mais sensíveis: a distribuição equitativa de medicamentos e vacinas entre países ricos e pobres.

A negociação revelou um abismo persistente entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento.

Enquanto países de alta renda defendiam mecanismos de mercado para acesso a tratamentos, nações mais pobres pressionavam por garantias concretas de que ficariam com pelo menos 20% de suprimentos essenciais, como vacinas e antivirais, em futuras pandemias.

O temor de repetir o "apartheid vacinal" visto durante a COVID-19 — quando nações africanas e latino-americanas ficaram para trás na imunização foi um motivador central.

Outro debate acalorado girou em torno da transferência de tecnologia.

Países em desenvolvimento argumentavam que, sem acesso a patentes e know-how para produzir localmente, continuariam dependentes de doações e iniciativas filantrópicas.

Já a indústria farmacêutica e governos de economias avançadas resistiam a flexibilizações que, em sua visão, poderiam desincentivar a inovação.

O acordo é visto como uma rara vitória para a OMS e o sistema multilateral em um contexto de fragilização dessas instituições.

Nos últimos anos, a agência enfrentou cortes drásticos no financiamento como os promovidos pelos Estados Unidos durante a gestão Trump e críticas sobre sua eficácia.

O pacto não apenas reforça o papel central da OMS em crises sanitárias, mas também cria obrigações legais para os países membros, como o compartilhamento rápido de dados sobre patógenos com potencial pandêmico; o fortalecimento de sistemas nacionais de vigilância e as contribuições financeiras previsíveis para um fundo global de preparação.

Apesar do avanço, desafios permanecem. O texto final teve trechos diluídos para garantir consenso como metas menos rígidas para doações de vacinas.

Além disso, a implementação dependerá da vontade política dos Estados-membros, muitos ainda relutantes em ceder soberania em questões de saúde.

Outro ponto crítico é o financiamento.  Sem recursos adicionais, países pobres não terão capacidade de cumprir as novas regras.

A proposta de um "tributo pandêmico" sobre grandes indústrias farmacêuticas foi descartada, deixando a solução desse problema para negociações futuras.

O acordo da OMS é um marco importante, mas seu sucesso dependerá de como as promessas se traduzirão em ações.

Enquanto a equidade não for tratada como prioridade e não apenas como um discurso, o mundo continuará vulnerável a ciclos de nacionalismo e desigualdade em futuras pandemias.

Como disse um diplomata africano durante as negociações: "Sem justiça, não há preparação. E sem solidariedade, não há segurança sanitária."


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