segunda-feira, 19 de maio de 2025

Portugal: o adeus ao centro e a nova era da direita radical

 

As eleições legislativas realizadas neste domingo, 19 de maio de 2025, marcaram um ponto de inflexão na história política de Portugal.

Embora a coalizão de centro-direita Aliança Democrática (AD) tenha conquistado o maior número de assentos no Parlamento, o verdadeiro terremoto político veio com a consolidação do partido de extrema direita Chega, que empatou com os socialistas em número de cadeiras e rompeu de vez o velho ciclo bipartidário que, por mais de cinquenta anos, ditou os rumos da democracia portuguesa.

O Chega, com sua retórica antipolítica, xenófoba e abertamente hostil aos direitos das minorias, emerge como ator central na nova configuração de poder. Não mais apenas uma força de protesto, o partido agora se vê diante da possibilidade real de influenciar diretamente o governo, seja como parte dele ou como principal opositor com voz amplificada.

A cada eleição, cresce em votos e influência, ocupando espaços geográficos onde antes reinavam os socialistas, como Beja, Setúbal, Portalegre e o sul do país, especialmente no Algarve.

Do outro lado, o primeiro-ministro Luís Montenegro, mesmo fragilizado por escândalos envolvendo sua família, conseguiu ampliar a vantagem em relação à disputa anterior.

A AD assegurou 86 assentos, mas mesmo com o apoio do Iniciativa Liberal ainda está distante dos 116 necessários para garantir maioria absoluta no Parlamento. Montenegro, que até então repetia o “não é não” ao Chega, desta vez adotou um tom mais evasivo: trocou a negação direta por um genérico “sim é sim a Portugal”, deixando em aberto a possibilidade de aliança com os radicais.

Essa ambiguidade tem um preço. O centro político está desaparecendo em meio à crescente polarização.

Ao endurecer seu discurso sobre imigração e segurança para tentar conter o avanço da extrema direita, a AD corre o risco de legitimar ainda mais essa retórica.

Ao mesmo tempo, o fracasso retumbante dos socialistas e das forças progressistas em manter uma frente unificada e mobilizada demonstra como a esquerda ainda patina em dar respostas convincentes à insatisfação popular.

A terceira eleição em três anos consolidou uma virada à direita em Portugal. A chamada “Geringonça”, a histórica aliança de esquerda que sustentou o governo de António Costa, tornou-se uma lembrança distante. O país que sai das urnas em 2025 é outro.  Mais fragmentado, mais conservador, mais vulnerável aos ventos autoritários que sopram por toda a Europa.

O desafio que se impõe agora é civilizacional.

Como defender a democracia num Parlamento em que uma força antidemocrática se torna indispensável para governar? Como impedir que o Chega dite os termos do debate político sem que o sistema se renda aos seus extremos?

A resposta ainda não está clara. Mas o futuro democrático de Portugal dependerá da coragem e da lucidez das forças que ainda acreditam na liberdade, na justiça social e no pluralismo como valores inegociáveis.

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