segunda-feira, 30 de junho de 2025

Quem manda no Orçamento? O povo ou o curral eleitoral?

 

Imagem - Migalhas
Na última sexta-feira, mais de 30 entidades, representantes da sociedade civil e dos três Poderes, sentaram-se numa audiência pública no Supremo Tribunal Federal para destrinchar uma ferida que há muito supura.  O sequestro do Orçamento público pelo Legislativo.

Estamos falando de mais de R$ 50 bilhões. Isso mesmo, bilhões que deveriam irrigar políticas públicas pensadas pelo governo eleito, mas que acabam irrigando curral eleitoral, compra de voto, dentadura pra quem não precisa, ambulância pra cidade que não tem sequer médico. Um Brasil que sangra dinheiro pra alimentar o apetite eleitoral de parlamentares que, há tempos, confundem fiscalização com apropriação.

O ministro Flávio Dino, no centro desse furacão, tenta mediar uma conciliação entre Executivo e Legislativo, num esforço que pariu a Lei Complementar 210 de 2024.

Essa lei, aprovada com fanfarra há um ano, criou regras claras: o dinheiro das emendas tem de seguir o cardápio de prioridades do governo, passar pelo crivo dos ministérios, ter coerência com políticas públicas nacionais.

É o mínimo num sistema presidencialista.  O presidente, eleito pelo povo, decide o rumo do país enquanto o Congresso fiscaliza, propõe ajustes, mas não toma o timão na marra.

Mas agora, quando a lei precisa sair do papel, a coisa emperra. O Centrão, esse monstro nutrido por interesses paroquiais e verbas bilionárias, faz beicinho. Não quer abrir mão do cofre, não quer devolver ao Executivo o que é do Executivo. Quer continuar distribuindo verbas sem transparência, prometendo pontes onde não há rio, asfaltando estradas que vão dar direto à sua reeleição.

Walfrido Warde, advogado que coassina a ação que sacudiu o Supremo, crava o que salta aos olhos.  Esse esquema desmonta, na marra, o presidencialismo.

Se o presidente não controla o orçamento, não governa. Vira refém.

Qualquer projeto nacional seja segurança, educação, infraestrutura, se torna refém de negociações paroquiais. O Brasil se torna um arquipélago de obras eleitoreiras, contratos suspeitos e superfaturamento.  Um convite diário à corrupção.

E quem ousa questionar vira alvo da narrativa de sempre: “É o Supremo interferindo na política”, gritam os donos do cofre. Balela.

O que o STF faz é proteger a Constituição. E, convenhamos, não é pouca coisa. O artigo segundo é pétreo: os poderes são harmônicos, independentes, com funções claras.

Usurpar o Orçamento é rasgar a Constituição pela costura mais sensível. O dinheiro do povo.

Enquanto isso, a cada escândalo, uma pergunta incômoda lateja.  Por que o Orçamento virou moeda de troca? Porque depois da Lava Jato e da queda do financiamento empresarial, ninguém quis encarar o elefante na sala?  Campanha custa caro. E fingir que meia dúzia de fundo público cobre tudo é ingenuidade, ou hipocrisia de quem lucra com o caixa dois institucionalizado na forma de emenda.

O recado é claro: ou o Brasil volta a debater o financiamento da política de forma adulta, com regras claras, fiscalização séria e transparência, ou continuará assistindo seu dinheiro escorrer pelo ralo de emendas que mais compram voto do que constroem país.

É isso ou seguiremos aplaudindo dentaduras superfaturadas, ambulâncias fantasmas e pontes para lugar nenhum.

No fim, a pergunta é simples: quem manda no Orçamento? O presidente que a maioria escolheu nas urnas, ou meia dúzia de caciques que loteiam o dinheiro público como se fosse quintal de sua casa?

A escolha será nossa e a conta, essa, já é de todos nós faz tempo.


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