“Não tenho casa,
não tenho sapatos
Não
tenho dinheiro, não tenho classe
Não
tenho saias, não tenho nenhuma camisola
Não
tenho perfume, não tenho cama
Não
tenho homem”...
Essa é a primeira estrofe da música Ain't Got No /
I Got Life da inesquecível
Nina Simone.
Aprecio demais tanto a
música, quanto sua autora. Ativista anti
racismo, ela canta aqui sobre tudo aquilo de que é despojada pela sua condição.
Adiante na letra inspiradora, ela virá exclamar porquê de estar viva, já que
não tem nada, até que começa a discorrer sobre aquilo que ninguém lhe pode
tirar. Seu cabelo, seus olhos, seu sexo etc.
A música parece perfeita,
mas há uma correção a se fazer.
O cabelo pode lhe ser
raspado. Sua liberdade tolhida, seus
olhos arrancados e sua boca costurada. Basta que seja atacada, agredida,
violada ou torturada.
Há, no entanto, apenas
algo que lhe pertence de fato e pelo que ela pode ter controle absoluto e em
nada depender de ninguém: Ela, eu e você temos o nosso pensamento. Individual,
próprio, pessoal.
É disso que quero tratar.
Nada é totalmente meu de verdade
além do meu pensamento. Eu posso controla-lo,
dividi-lo ou deixa-lo oculto.
Modificá-lo, recusá-lo ou transmuta-lo.
O resto está à mercê de quem é mais forte que eu, de quem tem algum tipo
de ascendência sobre mim ou ainda, depende de condições externas de meu íntimo.
O pensamento não. Eu posso cria-lo e trocá-lo ao bel prazer ou simplesmente
decidindo fazê-lo.
Sendo assim eu pergunto: por
que “diabos” eu penso o que não desejo e me martirizo por alguns desses
pensamentos? Por que penso que vou me atrasar enquanto caminho para um
compromisso? Ou por que penso que algum
acidente pode ter acontecido com aquele amigo que ainda não chegou para o
encontro que tínhamos? Por que penso que
meu empreendimento vai dar errado, que a TV nova vai quebrar ao ser tirada da
caixa ou que meu filho vai abalroar o carro que começou a dirigir?
Sem dúvidas não são
pensamentos que eu queira ter. Então
como estão lá na minha cabeça?
Bem, há uma distância
entre pensar e ter pensamentos. Quando
digo que o pensamento me pertence, falo sobre aquele que eu crio, não o que
surge. O que aparece na mente de repente, a me assustar, desmotivar, preocupar,
entristecer, não nasceu da mim. E por isso pode ser rejeitado, expulso,
apagado imediatamente ao surgir.
Sua origem é um
mistério. Pode ser uma certa memória de
algo ruim que ocorreu comigo ou com alguém e que eu tenha sabido. Uma sementinha que estava lá no subconsciente
só esperando a oportunidade de aflorar. Quem sabe até e de modo extraordinário,
ser algo imposto por uma espécie de mente coletiva? Uma informação etérea
captada pelo nosso receptor cerebral.
Pensamentos ruins quando
mostram sua “cara”, meio que a dominar o que sentimos, devem ser combatidos com
fogo mortal. E só há um meio de fazê-lo
com eficiência. Substituindo-os por
outros bons, construtivos, diferentes e felizes.
Ah, é muito melhor se
sentir bem do que mal. Estar alegre do
que abatido. Então por que dar vazão a
esses sintomas por permitir que pensamentos implantados, pelo sabe-se lá o que,
perdurem mais que um segundo fazendo seu estrago?
Dias atrás aguardava meu
filho chegar em casa e comecei a me preocupar com a chuva forte. Logo veio o pensamento de uma possível
derrapagem. Mas antes mesmo que a imagem
se formasse em meu cérebro, substituí isso por: “Ele gosta de coxinha. Vou fritar algumas para que chegue com essa
surpresa boa”. E na mesma hora imaginei
sua felicidade refastelando-se num prato de salgados.
Exercícios como esses
tenho repetido sempre que a oportunidade se apresenta. E sabe de uma coisa? Os pensamentos ruins têm diminuído. Meu humor
tem melhorado muito e parece até que as coisas começam a ser melhores.
Eu poderia fazer aqui a
defesa do pensamento positivo, promissor, edificador que tudo muda e cria ou
atrai de bom. Só que não é isso. Faço a defesa do não sofrimento à toa,
desnecessário.
Se posso conceber coisas
boas no meu ideário, por que permitirei as ruins ocuparem todo o espaço? E se
isso servir para melhorar meu astral ou até quem sabe, promover coisas boas, que
mal tem?
Estou praticando e
melhorando a cada nova tentativa. Acho
que vou ficar bom nisso. Quem sabe, de
fato, alguma lição maior nasça?
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