domingo, 14 de novembro de 2021

E o que é viver afinal?

 


Quando se é criança, brincar com os amigos é o que há de melhor.  Seja na rua, na casa da gente, em uma praça, na escola ou em qualquer lugar que seja.  Por isso fico tão preocupado com as consequências no emocional da criançada por conta do isolamento necessário vivido nos últimos tempos. Vi de perto meu filho mais novo, minha enteada e sobrinha, sem a saudável convivência com outros de sua idade a não ser pelo celular ou computador.  E foram meses intermináveis. Quase dois anos, até.

Frequentando uma escola virtual que, se por um lado oferece conforto e a alegria de estar em casa (nós bem que gostaríamos de ter passado por isso), por outro privando-os de colocar o “papo em dia”, das brincadeiras no pátio e mesmo do necessário contágio de pequenas doenças a fortalecer nosso sistema imunológico.

Há que se ponderar o que é pior.  O risco de contrair a COVID, que pode causar essa doença grave e até morte, ou as mazelas permanentes que ficarão acumuladas em meninos e meninas afastados de seus coleguinhas.

E vai além.  Adolescentes e jovens, também privados do encontro com a “galera”, sofreram bons bocados.  Meu filho do meio completou seus 18 anos sozinho com a família.  Passado o susto inicial e aliviada pela vacinação, agora essa turma quer tirar o atraso de uma só vez, sem se quer considerar que “o mar ainda não está pra peixe”.  Afinal, a Europa recomeça a viver com medo nesse exato momento.

Ontem eu me encontrei com amigos que já não via há um bom tempo.  Casais e seus filhos, que sempre me divertiram, animaram e despejaram seu carinho.  Que saudades!  Como foi boa e agradável essa noite.  O sentimento de acolhimento, as risadas, piadas, fofocas e abraços fraternos são fundamentais para uma boa saúde, tanto quanto o é a preservação da mesma pelas medidas de segurança orientadas.

É daí que veio esse meu pensamento.  Será que aquelas pessoas que obedeceram a rigor todo o protocolo de afastamento, de algum modo também não acabaram com algum prejuízo grave? E se sim, qual a profundidade dessa perda?

Bem, poderíamos dizer que a diferença consiste em estar ou não vivos.  Só que vivos estamos nós aqui e agora. Eu que estou escrevendo, você quem está lendo e outros.  Mas quanto, em si, perdemos de vida, posto que a vida é um conjunto de momentos?

Veja, por favor, em nenhum momento eu torno não perigosa a pandemia.  Também não descreio da ciência e das importantes recomendações para o uso do álcool em gel, máscaras e distanciamento.  Não sou negacionista.  Mas reflito se agora, com a vacinação, já não é mesmo o momento de se permitir que as pessoas se encontrem, vivam e respirem juntas. Que as crianças não possam voltar às escolas, aos clubes e a brincar na rua.

Penso sim naqueles pequenos, no auge de sua infância, deixando de criar brincadeiras, viver fantasias, trocar impressões e sorrisos e isso me dói pois vivi uma infância invejável.  Aquela de chegar em casa tarde e com o pescoço marcado de terra.  Tomar banho e voltar a brincar na rua para ter que lavar os pés antes de dormir.

E ontem, ao me reencontrar com amigos, me senti uma verdadeira criança, a rir até doer a bochecha. Isso também é vida.  Aliás, isso é vida. E privar-se disso para garantir a vida (sem isso), faz uma confusão danada na cabeça da gente.

Que droga de vírus, de pandemia, de medo da morte.  Que droga de perdas tão grandes e que todos sofremos direta ou indiretamente.  Foram dias das mães, sem mães com as mães ainda vivas.  Dias de Natal com ceia vazia e trabalho remoto, sem o intervalo do cafezinho que garantia falar mal do patrão.

Sinceramente espero que esteja no fim.  Que o ano que vem nos traga a libertação para que possamos, em nome da vida, voltar a viver.

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