quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Balbúrdia

Texto Publicado no DL News - 09/09/2019 
Eu sei contar. Mas não sei contar multidão. Também não importa quantidade.  Importa?
Por isso não sei dizer quanta gente passou, no domingo de manhã, pelo anfiteatro da Represa Municipal, onde gente feliz, de todas as partes da cidade, fez acontecer uma balbúrdia daquelas.
Tinha livro, tinha quadro, tinha varal de bordado, tinha música, ginástica, canto e teatro.  Tinha alegria, tinha emoção, tinha partilha e tinha festa. Tinha até café.  Eu tomei.
Protestar assim é o jeito mais transgressor de desobedecer. 
Isso mesmo.  É desobediência celebrar com arte e cultura, canto e poesia, liberdade e alegria, diante de um governo sombrio que aposta na desunião, na tristeza e na carranca.
Lá, entre sol e brisa suave, falou-se de meio ambiente, de igualdade social, de escola e hospital inclusivos, de formas diferentes de amor.  Ouvi algo em torno de comida sem defensivos.  É isso mesmo.  Orgânica, real, saudável... vida.
Tá bom.  Tinha partido também.
Tinha entidade, tinha textura, bandeira, camiseta e cartaz. Não vamos pensar que tudo isso caiu do céu. Afinal, lutar pelo melhor do mundo é coisa pra quem tem cara, posição. Só não tem medo.
Mas eles e elas, ah elas... falavam das mesmas coisas.  De tal forma que no final estava tudo colorido e com todas as cores representadas.
Senti um orgulho enorme.  Grandeza mesmo. Um misto de alegria e vitória, cada vez que me virei e vi um cidadão de bem.  Uma guerreira ou um outro indivíduo igual a mim. Aspirando e expirando, transpirando os mesmos sentimentos meus.  Era a certeza de estar do lado certo. Mais uma vez.  Uma convicção de saber-se um arauto da liberdade, da democracia. Do certo e do justo.
Caramba. Se eu era moleque em 64, agora eu sou adulto. E estou lá. Pra falar de flores, pra brigar pela paz.
Pra ensinar pros meus filhos, para aqueles que convivem comigo, que se a gente não for lá, todo tipo de mudança, será sempre pra pior.
Idosos, crianças, jovens, adultos.  Médicos, encanadores, professores e desempregados.  Andarilhos e ciclistas, casais em passeio e mesmo policiais.  Todos deram as caras.  Todos aplaudiram aqui ou ali.  Todos riram, muitos choraram.  Há quem dançou.  E por isso, há quem dançará ainda mais.
E sabe?  Pelo jeito não vai parar por aqui.  Que bom!
Dessa vez não me furtei ao meu compromisso.  Ao chamado.  À vocação de patriota verdadeiro.
Sim eu fui.  Sem lenço e sem documentos, com a certeza de que amanhã será outro dia e seguiremos caminhando e cantando, como nossos pais já fizeram um dia.

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