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Participação Popular Imagem - Jus Navigandi |
No início dos anos 2000, chegou à Prefeitura de São
José do Rio Preto Edinho Araújo, que conquistou sua vitória graças a uma
ampla coligação de partidos, denominada Frente Progressista, composta dentre
outros, pelos partidos PT e PPS.
Inaugurando uma nova forma de trabalhar a interlocução com o legislativo,
o prefeito então resolveu substituir a figura do Líder do Prefeito por um
Secretário de Governo.
Para o cargo, convidou Carlos Feitosa,
ex-vereador e hábil interlocutor.
Recém-criada, a Secretaria sob o comando de Feitosa
deveria, no entanto, se ocupar de outras importantes tarefas, para o que fomos igualmente convidados, o Prof. Cleyton Romano e eu que ocupamos sua Assessoria.
Criamos a estrutura da Secretaria com a
participação de outras figuras como Roberto Vasconcelos (Vasco), então Presidente
de Honra do PCB local e João Paulo Rillo, hoje vereador pelo PSOL, como importantes
conselheiros.
Juntos, passamos a desenhar o organograma da pasta
e a avaliar a cidade que enfrentava um dilema comum a muitas metrópoles
brasileiras: como garantir que as demandas dos bairros chegassem ao poder
público de forma organizada, direta e legítima, sem precisar se desgastar em balcões
ou trocar favores com vereadores.
A resposta surgiu com a criação do Fórum de
Associações de Moradores, uma iniciativa pioneira que uniu gestão
pública inovadora e participação popular efetiva.
Como assessor direto da Secretaria Municipal de
Governo e co-idealizador do projeto, testemunhei como essa experiência não
apenas modernizou a relação entre Estado e sociedade, mas revelou uma nova
geração de lideranças comunitárias.
Quero destacar algumas como o advogado Marcelo
Henrique, primeiro presidente do Fórum, o advogado Paulo Dodi, ex-presidente
da Associação Amigos de Rio Preto, Walter Fernandes da Associação do
Mansur Daud, Wilma Goulart do Jd. Nazaré e o já vereador Pedro
Roberto Gomes.
Todos eram presidentes de Associações de Moradores
dos respectivos bairros e atuaram de maneira contundente no desenvolvimento e
ações do Fórum.
Esse, por sua vez, devia congregar as Associações
por meio de seus representantes e conduzir ao “nono andar”, sede da Secretaria
de Governo, as principais reivindicações dos habitantes de cada bairro.
Muitas dessas associações eram informais ou
controladas por lideranças vitalícias.
Criamos um marco regulatório com estatutos-padrão e
eleições periódicas as quais eu acompanhava com a Assessoria de Damaris Iraê
e Valéria Brandt, também assessoras.
Oferecíamos assessoria jurídica gratuita além de
orientar a elaboração dos Estatutos e garantir as formalidades nas assembleias.
Depois ainda, participávamos das reuniões do Fórum que
visavam apresentar problemas detectados nos bairros e oferecer soluções trabalhando para isso e quando necessário, o envolvimento das demais secretarias da Administração.
Coordenei a equipe que percorreu os bairros para
convencer líderes da importância da formalização das Associações e ajudei na conexão
do Fórum com o Orçamento Participativo, então presidido pela
vice-prefeita Maureen Cury do PT.
Pela primeira vez, associações votavam
diretamente em obras prioritárias garantindo a melhor aplicação das verbas
orçamentárias.
Enquanto outras cidades tinham
Orçamento Participativo apenas no papel, em Rio Preto ele funcionou porque tinha
base organizada (o Fórum garantia representatividade real).
Durante nossa gestão, evitamos o clientelismo (as
demandas eram técnicas, não políticas).
Na ocasião, também coordenamos o mesmo processo com
bairros não regularizados, gerando fiscalização para coibir o nascimento de
novos loteamentos irregulares e promover as diretrizes para o processo de regularização.
Nessa altura, conseguimos asfaltar e regularizar a
Vila Miguelzinho (no coração do Eldorado) e entregar as escrituras de um grande
loteamento de chácaras.
A força do Fórum era inegável, e mobilizado no
próprio Paço Municipal era um peso para o Prefeito que já não tinha liberdade
total nas suas decisões.
Talvez essa tenha sido a real causa da demissão do
Secretário Feitosa, que foi exonerado após denunciar um incontável número de
faltas abonadas por servidores sob o laudo de um mesmo médico (que era
vereador). Estranho, já que a denúncia, na verdade, favorecia a Administração
do Município.
Com seu desligamento, tornei-me o interino na Pasta e por cerca de 2 anos, segui fazendo o trabalho de interlocutor entre o Fórum e a Prefeitura.
O fato é que o Fórum mostrou que participação
popular precisa de estrutura, que então garantimos, a partir da Secretaria.
Sua criação gerou importantes líderes, dos quais muitos ocupam cargos públicos.
Ainda, conseguimos provar que uma cidade média do
interior pode ser laboratório de inovação democrática. Talvez a mais
importante de todas as experiências das quais participei na vida.
Deixei a Secretaria me demitindo após a nomeação deu um outro secretário.
Mas o Fórum continuou incomodando e após minha saída da Secretaria, ele foi aos poucos sendo cooptado pelo governo municipal perdendo gradativamente sua força até desaparecer na gestão seguinte.
Resta dizer que o Fórum não foi um projeto de governo. Foi um pacto entre cidadãos e poder público e eu tive a honra de ajudar a costurá-lo.