As peripécias de Baía.
"É desnecessário que se diga o
porquê do apelido desse rapaz. Muito pouco crédito se deu ao que dizia “Baia”,
porém pelas suas características físicas não há como discordar que fosse
oriundo da “boa terra”. Tive o “prazer” de tê-lo como colega em 1950, na
terceira série do antigo curso primário, hoje ensino fundamental. Na verdade,
ele foi meu colega por apenas três semanas. Eu disse que tive prazer de tê-lo- como
colega pelo fato de ele nos ter brindado com algumas atitudes dignas de serem
relembradas. Nesse ano, não sei se estou certo, mas foi o último em que o Grupo
Escolar funcionou lá, no bairro São Benedito, local da fundação de Nova Granada,
e apesar de ainda existir o prédio, já naquela época ele se apresentava
bastante desgastado e necessitando de reformas, que devem ter sido realizadas,
pois eu lembro que em determinada época, ali funcionou a Escola de Comércio, a
popular “Escola do Jucão”.
Suas portas eram bem altas, com
quase dois metros de altura e, de modelo antigo, possuía duas folhas de
madeira. As janelas, como as portas, também eram maiores que as atuais, sendo
venezianas compostas por duas folhas cujas trancas eram ferrolhos do tipo
Cremona. Obviamente, as janelas eram de madeira.
Nosso diretor, se não me falha a memória chamava-se
Nelson. Nossa professora era dona Olga, esposa do diretor. O servente – hoje denominado
inspetor de alunos – era o senhor Guy. Para mim, todos saudosos!
No primeiro dia de aulas, ao
formarmos fila para adentrarmos à sala de aulas, nós tivemos a surpresa de
saber que entre nossos colegas se encontrava o endiabrado maquiavélico “Baía”.
Nosso horário de aulas era o vespertino. Um belo dia nossa
professora havia faltado e a substituta, apesar de que naquela idade não
percebíamos, parecia estar insegura. Após o Hino Nacional, naquela época o
cantávamos todos os dias antes de entrar em classe, fomos autorizados a entrar
em sala de aulas. Cada qual procurou sua carteira e assentou-se. Minha carteira
ficava junto à parede, mais ou menos no meio da sala. A carteira ocupada por
Baía ficava na mesma fila que a minha, mas no final, junto à parede detrás da
sala. Há alunos que adoram quando a professora é uma substituta, pois gostam de
aprontar.
Meia hora foi o suficiente para
que acontecesse! A professora passava pelas carteiras a fim de corrigir os
exercícios que nos passara. Ao chegar junto à carteira de Baía ela percebeu o
espelhinho colocado estrategicamente por ele, no solo. Pisoteou o espelho
fazendo-o em mil pedaços e, para complicar, deu um tremendo tapa na cara de
Baía, solicitando em seguida que um dos alunos fosse chamar o servente.
Esquecia-me de dizer que Baía era um garoto de físico avantajado em seus já
doze, treze anos.
Naquela época nossas canetas eram
compostas de um pedaço de madeira roliço com um encaixe onde colocávamos a pena
– de metal – e que para escrever, molhávamos no tinteiro. A lousa era de
madeira pintada de preto, colocada bem à frente da sala.
A
professora, após ter dado o tapa nele, pegou um giz e foi à lousa, onde começou
a escrever enquanto aguardava a vinda do servente. Baía pegou sua caneta e –
acredito que ele poderia ficar mais dez anos jogando-a que não conseguiria a
proeza que acabava de fazer – atirou-a em direção às costas da professora. Por
sorte, não conseguiu seu intento, mas como disse acima, a caneta, por incrível
que possa parecer, ficou cravada na lousa. Foi então que tanto o servente
quanto o diretor entraram na classe, pois ambos foram atraídos pelo grito de
terror da professora ao ver aquela caneta fincada na lousa, próxima a sua
cabeça. Corre daqui, corre dali e Baía pulou pela janela, passando a ser o
primeiro caso de aluno evadido que tive conhecimento em minha vida."Mais um dos textos de meu pai em seu livro de remanescências.
Desejo que publique em breve. Vale à pena.
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