Gabriel Gouvêa Gomes
Estudante de FilosofiaUniversidade Federal de Uberlândia
Inicialmente, o antropocentrismo em Hobbes é essencial para a elaboração da obra Leviatã. Uma pequena introdução ao autor se dá por esclarecer certas características gerais de sua obra e conceitos. A primeira é que, o homem hobbesiano não é um homem racional e político por natureza. Tal afirmação revela muito sobre os caminhos de seu pensamento. Para Hobbes, o homem vai adquirir a racionalidade através da aprendizagem pela educação, costume, cultura etc. É possível notar aqui, um contraponto a filosofia Aristotélica. A primeira coisa que irá definir o homem Hobbesiano são as sensações. Hobbes afirma, que a natureza é a arte na qual Deus fez o universo, tal arte segue as regras divinas, gerando assim, movimento. O homem sente a natureza através das sensações e pelo o movimento que a natureza faz no corpo.
Pode-se
entender então, que o movimento é algo muito essencial no pensamento
Hobbesiano. Já que o princípio de autoconservação do homem é o que regula sua
ação, e que autoconservação é conservar-se em movimento. Além dessas
características, é necessário entender também o conceito de Leviatã. Um ser
mitológico que representava os limites dos navegantes e marinheiros, aqui é a
representação do estado. No qual representa um homem artificial feito pelo
homem a sua imagem, de poder limitador, soberano e que defende seu povo.
Mas
a Arte vai além ao imitar o mais racional e excelente trabalho da Natureza, o
Homem. Pois, por meio da Arte, foi criado o grande LEVIATÃ chamado de estado,
que não é senão um Homem Artificial que tem a finalidade de dar vida e
movimento a todo o corpo. (HOBBES, 2015, P.13)
Continuando,
na obra, o Leviatã vai ser representando como um homem máquina soberano formado
de outros homens, no qual irá representar o poder absoluto. A coroa representa
a monarquia, a espada representa a segurança, o cedro representa o poder
soberano sobre o cumprimento do contrato e por fim sua altura é a dominação
perante a cidade. Disto, Hobbes nos informará que o homem é o princípio e o fim
da política, ou seja, a política deriva do homem. O homem é a forma, poder e
matéria do estado. “Primeiramente, sua Matéria e seu Artífice; ambos são o
homem.” (HOBBES, 2015, p. 14). Para entender mais sobre o Leviatã, Hobbes irá
realizar uma profunda investigação filosófica acerca da natureza do homem.
Por
conseguinte, Hobbes nos explica, que o homem tem um estado de natureza. Foi
constatado que tal estado difere do de Aristóteles, aqui o estado de natureza
do homem é a guerra. Uma sucessão de conflitos e competições.
Desse
modo, se dois homens desejam a mesma coisa que, não obstante, não podem ambos
aproveitar, eles se tornam inimigos; e cada um deles, na forma de seu Objetivo
(que é principalmente a preservação de sua vida e, às vezes, somente seu
próprio deleite), se esforça para destruir ou subjugar o outro. (HOBBES, 2015,
P. 116)
Segundo
Hobbes, os homens podem todas as coisas igualmente, diante isso, irão utilizar
todos os recursos para alcançar seus desejosos “Portanto, se dois homens
desejam a mesma coisa, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por
ambos, tornam-se eles inimigos” (HOBBES, 2015, P. 115), ocasionando assim, um
estado de natureza pautado em guerras e conflitos, diante das competições
individuais. Portanto, os homens em estado de natureza, irão travar guerras
para se sobre por a outros homens. “A partir disso, torna-se claro que,
enquanto os homens viverem sem um Poder comum para mantê-los todos intimidados,
eles viverão nesse estado que é chamado Guerra.” (HOBBES, 2015, P. 117).
Hobbes
entende que, os homens por serem semelhantes tanto fisicamente quanto
intelectualmente e por poderem todas as coisas de maneira semelhante, irão se
impor uns aos outros através da violência. Hobbes nos explica que, os homens
anseiam para sair de tal estado e que esse desejo se fundamenta em parte nas
paixões. Tais paixões que inclinam os homens à paz são o medo da morte, o
desejo necessário de se ter uma vida adequada e a esperança. Diante disso, Hobbes diz que nós homens somos
governados pelas paixões, através do uso da razão calculamos as consequências
boas ou más das ações que visam a satisfação das paixões. Por isso, se torna
necessário a existência de um poder forte e limitador para que mantenha os
homens em ordem e fora de seu estado natural de guerra.
Em
sequência, é de certa importância compreender que, o poder regulador não existe
no estado de natureza. Ele virá existir a partir da criação do Estado e do
contrato social. Por hora, precisamos esclarecer o porque do estado de natureza
humana ser o de Guerra. Recapitulando, em primeiro lugar, os homens são
governados pelas paixões e por meio do uso da razão, irão tentar satisfazer de
todo jeito as paixões. Por poderem realizar todas as coisas de maneiras
semelhantes, os homens travarão conflitos entre si sempre visando a realização
de suas paixões, gerando um estado natural de guerra. De acordo com Hobbes, a
guerra é uma consequência das paixões. Para entender a relação entre as paixões
e a busca infindável de poder é necessário entender o que são as paixões.
Sucedendo,
para Hobbes as paixões são movimentos voluntários de origem interna. Tais
paixões ou movimentos, são duas: desejo e aversão. No qual o desejo, é o
movimento que leva o indivíduo a aproximação do que o realiza. Já a aversão é o
movimento contrário do desejo. No qual, o homem irá se movimentar afastando-se
daquilo que o desagrada. No fim, as paixões sempre irão anteceder as ações
humanas, sendo um forte expoente de algo que os motiva ou desmotiva.
Quando
esse esforço direciona-se para algo que o causa, é chamado de Apetite ou
Desejo; este é o nome geral, e o primeiro fica muitas vezes restrito à
significação de Desejo por comida, ou seja, fome e sede. E, quando o esforço
direciona-se para evitar algo, é chamado de Aversão. (HOBBES, 2015, P. 54)
Pode-se
notar então, o tom mecanicista da teoria das paixões em Hobbes. Ele irá se
diferenciar muito do pensamento grego (Principalmente do aristotélico),
felicidade para Hobbes, é movimento. O qual consiste na realização máxima dos
desejos do homem. Pode se dizer, que a felicidade Hobbesiana é a satisfação ou
realização máxima de seus desejos e a evitação total das coisas aversas e que
causam aversão. Todavia, a felicidade amplia-se para além de tal afirmação.
Pois, ela é também, dispor de tais meios da realização de tais questões, esse
dispor de tais meios, é entendido como, Poder. A partir de agora, o desejo do
Poder irá ocupar-se de grande parte da filosofia política de Hobbes. Relaciona-se
a Guerra diretamente com a obtenção de poder. Pois, na sua eminente busca por
mais e mais poder do homem (Para a realização e satisfação de seus desejos), é
onde a maioria dos conflitos é ocasionada. Ocasionando, o estado natural de
guerra. “O Poder de um Homem, tomando o conceito de forma Universal, são os
seus meios atuais de obter algum bem aparentemente futuro e pode ser Original
ou Instrumental” (HOBBES, 2015, p. 83).
Portanto,
a relação entre a busca infindável de poder do homem, o estado de natureza como
um estado de guerra e a teoria das paixões em Hobbes se dão por tais sequências
fatoriais. É entendido e observado por Hobbes, que os homens são governados por
suas paixões e não pela razão. As paixões são movimentos internos que diferem
em desejo e aversão. Para o homem ter sua completa realização plena ou
felicidade, ele precisa ter o máximo de realização ou satisfação de seus
desejos e evitar ao total suas aversões. O meio para tal conquista é o Poder. O
homem precisa de poder para realização de seus desejos, só que também, o homem
sempre irá precisar de mais e mais poder. Ou seja, o poder atual, por maior que
seja, é sempre insuficiente, pois como disse, Agostinho Ramalho Marques Neto, quem
já teve aqueles meios e não os tem mais, não tem poder. Quem irá tê-los, mas
ainda não os tem, não tem poder. Há, pois, nessa concepção de poder, um caráter
temporal, que envolve necessariamente uma dimensão de atualidade. Resulta-se, a
partir de toda a sequência de fatos a relação entre a teoria das ideias e a
busca do poder com o estado natural de guerra. Pois, o homem sobre o comando
das paixões e na intenção de satisfaze-la o máximo possível irá partir em uma
busca constante de poder, essa busca incessável por poder é a grande
originadora dos conflitos movidos por intenções individualistas. Por os homens
serem semelhantes, eles sempre iram buscar poderes semelhantes, gerando assim,
conflitos entre eles e tendenciando à um estado natural de guerra.
Bem
como, tais afirmações geram uma solução para a questão do estado de natureza de
guerra. O Leviatã, como dito antes, é a representação do Estado. No sentido
figurado, o Estado vai ser representado por um grande monarca. Seu corpo, é
formado por diversos homens que representam o poder limitador do estado sobre o
homem, mas também, representa que a essência de todo o estado é o homem. O
Leviatã tem como principais funções: a proteção de seu povo e um poder
soberano, forte e limitador sobre os homens. Mas por que o homem irá criar o
Leviatã e por que ele criaria algo com força soberana que limitaria o próprio
homem? Conseguintemente, o homem então através do ato de Contrato Social, um
acordo ou consenso entre homens, no qual os mesmos irão abrir mão de parte de
sua liberdade que os tem em seu estado de natureza, fazendo assim, o Leviatã.
“A transferência mútua de Direitos é aquilo que os homens chamam de Contrato”
(HOBBES, 2015, p. 124) Um ser soberano, forte e limitador. Mas por que? No Estado de Natureza, o homem possui
liberdade e características naturais que nascem com ele, nas quais sabemos que
se origina o estado de guerra sem fim. É importante lembrar-se que o princípio
de autoconservação é o que regula todas as ações dos homens. Deste modo, a
criação do Leviatã tem como primordial função a autoconservação do homem
(posteriormente, o Estado Civil também irá se autoconservar).
Para
um entendimento aprofundado, se dá por necessário um desmembramento das partes.
Primeiramente, precisamos definir certos conceitos. O primeiro é o de Direito
Natural: O direito natural é o direito que o homem tem de tomar tudo que suas
forças, astucias e prudências conseguem para se autoconservar. “Consiste na
liberdade de cada homem para usar seu próprio poder da forma que desejar para a
preservação de sua natureza; isto é, de sua própria vida.” (HOBBES, 2015, P.
121). O conceito de liberdade é definido por Hobbes como aquilo que você pode
fazer, tudo que está a seu alcance.
entendo,
de acordo com o significado apropriado da palavra, ausência de impedimentos
externos; tais impedimentos podem, por vezes, tomar do homem parte de seu poder
de fazer o que quiser, mas não podem impedir que ele utilize o resto de seu
poder conforme dito por seu julgamento e por sua razão. (HOBBES, 205, P. 121)
Hobbes vai também definir a lei
natural, como algo que obriga e limita as possibilidades de ações dos homens.
“Lei Natural é um preceito ou regra geral fundada na razão, a qual proíbe o
homem de fazer aquilo que seja destrutivo a sua vida ou que remova os meios
para preservá-la” (HOBBES, 2015, P. 121). Então, conclui-se que é no estado de
natureza, antes do estado civil que o indivíduo vai ter a maior liberdade
possível. Certo, por que então o homem irá restringir tal liberdade com o
Estado Civil, através do contrato social? Pois, apesar de o homem ter a máxima
liberdade, ele encontra-se em uma situação de guerra constante. No qual o medo
de perder sua vida é iminente. Logo, as paixões medo e esperança, movem o homem
a utilizar a razão para calcular qual seria a melhor maneira de sair desta
situação. Concluindo, que se há uma esperança de houver paz, o homem deve
buscá-la. “Consequentemente é um preceito geral da razão: Todo homem deve se
esforçar pela paz, na medida em que tenha esperança de chegar a ela; e quando
não puder atingi-la, ele deve buscar e utilizar todo auxílio e benefício da
guerra.” (HOBBES, 2015, P. 122).
Por fim, o contrato social surge
como uma maneira de se alcançar a paz por meio do Leviatã. O desejo da paz é
movido pelas paixões de esperança e medo, fazendo com que o homem utilize da
razão para calcular qual a maneira de se encontrar a paz. A maneira vem com a criação
de um Estado Civil, um estado forte e limitador, no qual os homens realizarão a
transferência de parte de sua liberdade para o poder soberano que está acima de
todos os contratantes. Entende-se, que o contrato social é um consenso entre os
homens que abrem mão de parte de sua liberdade para a criação de um Estado
Civil forte, soberano e limitador. Afim de realizar a autoconservação de suas
vidas.
Referências
Bibliográficas:
·
HOBBES, THOMAS. LEVIATÃ: OU MATÉRIA,
FORMA E PODER DE UM ESTADO ECLESIÁSTICO E CIVIL. Edição Edipro, 2015
·
RAMALHO MARQUES NETO, AGOSTINHO. HOBBES E
AS PAIXÕES. EMPÓRIO DIREITO. 2015. Disponível em: https://emporiododireito.com.br/leitura/hobbes-e-as-paixoes-por-agostinho-ramalho-marques-neto
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