segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Friozinho na barriga

Uma sova na vaidade e na arrogância de se pensar com o melhor projeto ou por acreditar que bastava ser formado em Administração Pública.
Com praticamente a metade da votação que tive quando fui candidato a vereador há 20 anos, vi encerrada a apuração de ontem da eleição municipal, agora como candidato a prefeito de Rio Preto.

Foram apenas 526 dos votos válidos que aprovaram e preferiram o projeto “Rio Preto Pra Valer” que defendi com ardor durante toda a campanha. Ou seja só 0,26% dos eleitores da cidade. Uma inexpressiva votação, para não dizer vergonhosa.

Eu poderia ficar triste ou decepcionado, o que me consolaria, só que não tenho esse direito. 

Como milito politicamente há mais de 35 anos, já devia estar ciente de alguns pontos no universo eleitoral rio-pretense e com isso preparado para tal cenário.

Vou até discorrer sobre eles, mas nada substituirá em seguida uma fortíssima e necessária autocrítica que preciso fazer acerca de meus próprios procedimentos durante a campanha. 

Vamos primeiro aos fatos que com certeza foram determinantes nesse resultado:

1º - A cidade tem mais de 70% de seus habitantes na Classe Média.  E essa faixa é aquela que se acredita “bem de vida”. Boa parte dela até é, mas a outra sonha em ficar, e por isso tem dificuldades em se ver como componente da Classe Trabalhadora se esquecendo que precisa trabalhar todo dia pra se manter.  Não quer ser vista como tal e, portanto, se recusa a apoiar qualquer projeto que venha da esquerda;

2º - Essa mesma composição social porque se confunde com relação ao seu pertencimento de classe, aceita com facilidade o discurso da direita e em certos casos, vai além, apoiando inclusive projetos perigosos para sua sobrevivência como o de privatizar tudo, o que a levará a pagar pelos serviços públicos. E ainda por cima acha chique isso;

3º - Diante desse quadro, a união da esquerda se fazia necessária, senão para ganhar as eleições, para manter um coletivo coeso, com mais tempo de TV, chapa mais forte e verba reunida, tudo colocado em prol da eleição de vereadores.  Até tentei ou tentamos, Deus o sabe, mas o final e detalhes, todo mundo conhece. Somados, no entanto, os votos dos três principais partidos da esquerda foram mínimos;

4º - Dez concorriam, dentre os quais, o prefeito atual que ocupou a prefeitura por três mandatos.  Quatro outros defendiam projetos da direita conservadora, disputando Bolsonaro como aliado, o que agrada uma parcela, felizmente cada vez menor, do eleitorado acima mencionado.

Ora, como eu poderia pensar que o resultado seria diferente pra mim?  Entre os concorrentes da esquerda, meu partido era o menor, menos representativo e na cidade, menos organizado já que até pouco tempo jazia desestruturado, abandonado que foi pelos dirigentes anteriores.

Isso sem falar no seu nome, “assustador” para certas pessoas que, sem sequer saber por quê, trazem nas costas o anti-comunismo cravado.

Perdi a conta de quantas vezes tive que responder a questionamentos sobre comunismo pra gente que não sabe nem o que é capitalismo, socialismo ou liberalismo.

Feita essa preliminar, vou agora ao mea-culpa, ou a parte que me cabe diretamente nisso tudo. Não por justificativa, repito, mas como autocrítica.

Comecei a pré-campanha em agosto, ainda sem chapa de vereadores constituída e com o partido em reconstrução. Candidatos a prefeito se cercam de cabos eleitorais de primeira linha, a saber os candidatos a vereador, que irão pedir votos para si e para seus majoritários com ajuda de seus familiares e amigos. 

Ainda, ciente do pequeno espaço no horário eleitoral, deixei para o final os impulsionamentos na internet enquanto todo mundo fez isso no início, chegando rápido a maioria dos lares e celulares. 

Compus um núcleo duro de campanha com gente firme e competente. Mas a estrutura nunca foi suficiente.  Trabalhamos como doidos, por meses, sem qualquer orçamento, pois todo ele seria composto unicamente pela verba eleitoral que só chegaria mais no final, em meados de outubro. Comparados aos milhões de outras campanhas, nossos pouco mais de R$ 35 mil reais acabaram fazendo milagre.

Sabendo da força do eleitorado da Zona Norte, cumpri as regras de controle da pandemia e deixei para o final da campanha a ida às ruas. Não estava de todo errado, mas sendo um completo desconhecido eu devia ter aparecido mais por lá.

De um modo inesperado, a imprensa nos deu muitas oportunidades e foi galante o tempo todo minimizando a falta de visibilidade pelos meios naturais. Aproveitei cada espaço sem titubear. Também não me faltaram elogios, mas não me assoberbei com eles. Vieram apoios honrosos, mas não me encostei por isso.

Se por um lado estudei Rio Preto e cumpri com rigor a ritualística completa de uma campanha, pois não faltei a debates, não recusei entrevistas, não deixei de participar de encontros, de assinar documentos, de realizar áudios-conferências com grupos de apoiadores.  Por outro admito que não fui o candidato do povo.  Não parti para agressões gratuitas aos adversários, não exibi o riso fácil que me faria populista. Nos horários gratuitos do rádio e TV, fui pragmático na apresentação dos eixos do meu Programa de Governo, sempre falei com vigor e rapidez, sem representar o cara sereno e simpático que todos “iriam querer” abraçar. Não estive no calçadão aos sábados, só fui ao terminal rodoviário uma vez, nem compareci às feiras livres todos os dias. 

Basta ver quantos votos brancos e nulos deixei de conquistar, pois esses nitidamente desaprovaram todos os projetos, seja por não concordar com eles ou desconhecê-los, o que é mais provável no meu caso.

Já vivi campanhas demais, embora nunca para mim mesmo.  Mas não podia ter sido tão amador. Com isso tudo comprometi o que acreditei ser o mais avançado Programa de Governo que vi apresentado na minha cidade. As urnas são e pra mim foram implacáveis.

E agora?  

Tem tanta coisa pra fazer.  Tem loteamentos irregulares no em torno da cidade para organizar, regularizar, levar serviços e atendimento básico.  Tem escolas para preparar para o pós pandemia, pra equipar e dar dignidade aos professores.  Tem empresas limpas e da área da tecnologia para trazermos para cá fortalecendo a economia e gerando vagas de empregos.  Tem enfrentamentos importantíssimos e urgentes para evitar novos racionamentos de água.  Tem a saúde preventiva para fazermos de fato com apoio das faculdades da área da saúde.  A Cidade Inteligente para implantarmos com urgência. A ampliação da Cultura e do Esporte como mecanismos de inclusão e promoção social.

Pior que eu não queria submeter meus apoiadores e eleitores à impressão de que nosso projeto fosse ruim. Posto que ninguém o quis, até eu fico a pensar em tal hipótese. O pior, para ficar em último lugar, eu sei que não é.  

Na verdade eu queria vê-lo, ainda que em parte, aproveitado, corrigido, implantado, comentado, exibido ou qualquer coisa que não fosse aposentado, engavetado ou descartado. Só isso me aborrece agora.  Mas fazer o que.  Essa é a face exposta da Democracia.  Não sou eu quem decide o quando ou o como, mas sim é a maioria dos cidadãos.  Cabe-me o cumprimento resignado desse papel, qual seja o de aceitar a derrota sem prostração.

E assim fico, embora faça um apelo aos cidadãos e cidadãs rio-pretenses para que juntos tentemos avançar um cadinho nesse projeto que aprovaram com inegável imensa maioria dos votos. Dá pra gente fazer isso juntos se organizados e reunidos, mas só se quiserem, sem imposição minha ou de quem quer que seja.

Claro, não poderia ser de outro modo, vou estar a postos com meu livrinho-programa.  E com certeza também a Merli, o Darok, a Marcella e o Sr. Dirceu. Os camaradas todos do PCdoB.  Acredito, já que subscreveram nosso Programa, que concordam comigo. 

Essa luta, que chamei de bom combate parafraseando São Paulo, tem que ter valido à pena. 

Enquanto isso, cumprimento com respeito o prefeito eleito pela sua vitória, sinal de aprovação pela grande maioria de nossa gente, e sigo minha jornada como cidadão, que apesar de levemente abatido, agora carrega consigo aquele friozinho na barriga, sensação preciosa e indelével de dever cumprido. 

Por hoje é o que quero repartir com cada um daqueles 526. 

8 comentários:

  1. Camarada querido. Voce combateu o bom combate. É um combatente da esquerda. Seguimos na mesma trincheira de combater o capitalismo e as mazelas trazidas por ele: fome, desigualdade social, violencias, destruições. Sua luta, nossa luta. Como petista sei como se sente. Mas lembre-se essa cidade conservadora, machista, reacionaria, racista elegeu esse Ser fascista no poder central. O prefito reeleito é golpista e votou nele. Eleger mulher? Aqui! Só se for de direita evangelica, tambem machista. Mas vamos comemorar a esquerda elegeu o Joäo Paulo e as Coletivas estão na suplencia. E tiveram mais votos que um dos eleitos.
    E nós. Jamais iremos desanimar, pelo contrario iremos incomdar muitooo.
    Em memoria de nossos martires: homens e mulheres lutadores do povo: nenhum minuto de silencio. Mas toda uma vida de luta.
    Tamu juntos
    Abraço
    Tidda Vernucci.

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    1. Ah essa luta em 22 será intensa, necessária, libertadora. Estaremos todos juntos com certeza.

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  2. Enfrente que vem gente junto. Grande abraço!

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    1. Sempre. Ficar triste, talvez. Desanimar, por direito. Desistir, jamais.

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  3. Força e fé Sr Carlos Alexandre!
    Conquistou meu voto na última semana, após os debates.
    Espero que logo consigamos somar mais eleitores com consciência às lutas que clamou, tão necessárias, tão emergentes.

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    1. Que bom ler isso. Fortalecedor, motivador. Obrigado mesmo. Sim, permaneço com a mesma determinação por mim, meus filhos, por você e as demais gerações. Vem comigo?

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  4. Eis as palavras de uma candidatura honesta. Levou a mensagem correta. Os ouvidos é que não estavam abertos pela ideologia. E de fato, não há milagres numa campanha nestas condições desiguais.

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    1. A ideologia... sim, talvez seja esse o ponto. Fazer como fazem os que lidam com marketing... Dizer a mesma coisa, só que diferente... Forma de abrir os ouvidos moucos. Estratégia diferente, mas sempre carregada da verdade incontestável que nos mantém no rumo.

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