"Estamos vivendo dias sombrios no mundo."
Perdi as contas de quantas vezes li ou ouvi esta frase ao longo deste, ainda jovem, ano de 2017.
Será verdade?
Risco de uma guerra de padrões mundiais, aumento ou reflexos de uma crise econômica de grandes proporções, novas doenças aparecendo ou se metamorfoseando, desemprego em alta, principalmente no Brasil onde o recorde já foi até superado, além de outras tragédias previstas ou assinaladas pelos fãs do catastrofismo, são algumas das principais causas desta anônima avaliação.
Um fato no entanto e bastante concreto parece ser que o Mundo vem atingindo padrões de avanço tecnológico nunca dantes experimentados.
Já é real o carro que anda sozinho. Mercedes, Audi e outras marcas, até populares, já demonstraram e alavancam a produção em larga escala destes modelos.
Também é fato o carro partilhado, quebrando o paradigma da propriedade do automóvel.
E para não ficarmos só falando de veículos, não são raras as residências comandadas por voz nas suas mais ortodoxas funções como acender lâmpadas, ligar aparelhos, trancar portas e informar a previsão do tempo.
Autômatos nos atendem nas companhias para responderem questões básicas, fazerem reservas e promover avaliações.
E já é possível se visitar uma loja, experimentar a roupa e realizar a compra sem sair de casa.
Sinal dos tempos?
Pode ser. Mas modernidade e facilidade deveriam ser sinônimos de melhores dias.
No campo da espiritualidade ou filosofia dá pra viajar neste tema. Tudo bem também se ficarmos divagando com relação a visões de mundo que trafegam entre a Transição Planetária e a dimensão maior do desenvolvimento humano. Imagine pra mim que creio na espiritualidade e também em extraterrestres.
Mas se formos falar de negócios e economia, então teremos que ir um pouco além nesta conversa.
Devemos voltar nossos olhares para a relação negocial e funcional de todas as empresas, que começa e termina, evidentemente com a relação entre as pessoas.
O que me preocupa, em tudo isso, ainda fica sendo esta relação do Homem com seu semelhante.
Emprego e sucesso nos negócios, não podem abandonar este indispensável modelo de relacionamento por mais que hajam instrumentos de substituição.
As pessoas, encantadas ou distraídas pelos intermediários cibernéticos da comunicação, parecem ter se esquecido de algumas regras de comportamento que tornam viva e próxima a relação interpessoal.
Por exemplo, falar qualquer coisa fica mais fácil pelo WhatsApp ou pelo Facebook. Tudo parece doer menos se mandamos uma crítica ou agressão na forma de mensagem. Afinal, olhar nos olhos e ter um feedback imediato da reação do outro não é pra qualquer um.
Por isso aquele que mantiver o velho formato do contato humano, obterá as melhores vantagens em uma negociação, qualquer que seja ela.
Que tal o aperto de mão, o falar sem condenar e sem se queixar, só pra tornar o papo mais agradável? Avaliar e criticar podem ocorrer, desde que com apreciação honesta e sincera das partes boas em detrimento daquilo que não vai bem. Só pra variar.
Outro ponto importante é conseguir demonstrar afeição, sorrir e se interessar de fato pelo interlocutor, mesmo com todas as diferenças por resolver.
Em mensagens a se responder virtualmente isso é impraticável. São regras simples da boa comunicação ser bom ouvinte, chamar o interlocutor pelo nome, tocar-lhe a pele uma vez ou outra e permitir que fale um pouco sobre si, afinal é justo dar ao outro lado, espaço semelhante ao ataque, para sua defesa.
Pelos mecanismos indiretos, delegamos ao receptor da mensagem o dever da interpretação, quando nos cumpre, na verdade, bem explicar nossa ideia ou aquilo que desejamos que seja entendido.
E assim o diálogo vira só discussão.
Como se pode ganhar uma discussão onde ambos querem dar a última palavra? Discussão ganha é aquela que não ocorre no formato de uma briga.
Quase sempre e involuntariamente, quando sabemos de algo que nos agride, somos vítimas do impulso de responder com agilidade e justificativas. Já no diálogo direto e pessoal, surgem de imediato os pontos convergentes, que superam em muito as questões que distanciam antes mesmo daquilo virar uma pendenga.
Não há nenhum êxito em uma imposição. A vitória real é aquela que nasce da concordância dela própria. E eu por exemplo, sou muito mais desarmado diante do elogio que antecede a crítica, do que pela crítica que antecede o reconhecimento.
E pra saber a diferença entre uma e outra situação, só ao vivo e em cores.
Eis aqui pra mim o que torna realmente sombrios os dias de hoje. O afastamento do humano.
Claro que eu tenho desafetos. Pessoas que não gostam de mim, ou que não concordam com o que faço, com o que penso, com atitudes que tomo. Mas tudo é tratável e sobretudo, compreensível. Jamais vou levar para o lado pessoal e boa parte destes, sei que também não.
Já houve grandes embates entre mim e alguém que terminaram em "valeu então, fique com Deus" e por fim, "você também".
Não há porque ser diferente. Até porque não sou o dono da verdade, não sou perfeito e tenho muito mais condições de errar, do que acertar. E aprendi, na vida, que jamais devemos transportar isso para o relacionamento interpessoal onde ambos perdem sempre. Por isso, quase todos os dias, meus debatedores terminam nas minhas orações. Mesmo quando rebato com total veemência, evito pensar que saí vitorioso, pois na relação humana, se alguém vence é sinal que alguém perdeu. E se no relacionamento, alguém perdeu, perderam os dois.
Ainda que não se chegue a um denominador comum durante o embate, no final o tradicional "muito obrigado por se manifestar" ou ainda o "fique com Deus", serão mais fortes e melhores do que qualquer atitude de prejuízo moral, intelectual ou material.
Aos quase cinquenta anos, itens como memória, compreensão, além da audição e visão, já não me são tão bons quanto o foram no passado. E portanto, melhor eu confiar no interlocutor, que tem tudo isso mais aclarado, mais vibrante e vigoroso, do que nos meus já falhos sentidos.
Todos os dias eu vou pra cama sem a certeza da manhã seguinte, mas durmo com a convicção plena de que cresci bastante naquele dia e principalmente, ganhei ou recuperei a amizade e o respeito de alguém que antes estava triste, magoado, decepcionado ou injuriado comigo. Tudo porque conseguimos nos falar.
Pode ser que um dia eu perca tudo. Bens, negócios, até amizades, mas não perderei esta essência. Parece arrogante? Só quem convive comigo sabe o quanto é verdadeiro. Sou amante do bom debate e do bom entendimento. Sempre!
E enquanto eu pensar assim, pelo menos pra mim, meu mundo está bem distante do fim.
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