domingo, 25 de março de 2018

A quem interessa que estejamos em campos opostos?

Temer e tudo o que representa neste momento são fortalecidos
quando a esquerda se divide em questões menores.
Eu admiro as pessoas convictas.
Sempre admirei quem tivesse certezas absolutas sobre qualquer coisa.
Também eu tenho minhas convicções e muitas vezes, não abro mão delas, nem pra ouvir opiniões contrárias.  Tolice na certa.
Afinal agir assim tem lá seus custos.  Por exemplo, o custo de poder estar errado e de, não sendo corrigido, permanecer no erro.
Há inclusive pessoas que são convictas sobre algumas questões bastante complicadas.  Não tem aqueles que acreditam, ainda hoje, piamente, que olhar no espelho após o almoço faz mal? Que comer manga e tomar leite em seguida pode matar?  Pois é.
O ideal, no caso das convicções, seria o debate afim de colocar nossas certezas à prova.  E de preferência, debater com quem tem subsídios para derrubar nossos argumentos ou então afiá-los, quando nós formos capazes de fazer o contrário.
No Brasil há uma estranha tendência de as pessoas acharem que certas convicções só se sustentam em um determinado conjunto de coisas.  Depositam quase tudo no campo da dicotomia.  Direita e esquerda, flamengo e fluminense, masculino e feminino, minorias e maiorias, politizados e despolitizados, certos e errados, petralhas e coxinhas etc.
Não se admitem caminhos, posições complementares.  Sobretudo não se faz uma avaliação holística.
Se falamos de gênero, simplesmente não se admite um terceiro que será logo visto como anomalia e deixamos de discutir pontos fundamentais do tema. E se olharmos para a questão que envolve Flamengo e Fluminense, ou Corinthians e Palmeiras, perceberemos que haveria um nicho enorme para se debater em favor do Esporte.  O futebol e tudo o que o cerca.  Sua evolução, involução, corrupção entre os cartolas, jogadores descompromissados, torcidas e seu comportamento, gestões mal conduzidas dos clubes e como a categoria esportiva na qual ele está inserida pode promover crianças e jovens por toda parte etc.  Tudo desperdiçado se alguém ficar só defendendo seu time.
Na briga entre direita e esquerda não é diferente. Petralhas e coxinhas, politizados e despolitizados há como ampliar o debate se classificarmos de "política" e a partir daí balizarmos todas as questões que a envolvem.  Tem cabimento aqui a discussão das liberdades, das dívidas sociais, da condução econômica do país, da educação e de outros itens como os casos de corrupção que atingem diretamente as populações.  Já pensou que se qualificássemos os debates a esse nível poderíamos mudar tudo?
Se for sempre assim, um debate fértil, sincero, embasado, ampliado, todos nós sairemos ganhando muito. 
Contudo, quando a convicção dá lugar a paixão, já não há como debater.
Não há como fazer um bom debate sobre futebol se um dos debatedores for apaixonado cegamente por seu time.  Ao falarmos de qualquer coisa sobre o esporte, ele transferirá imediatamente para o seu time do coração e poderá se sentir engrandecido ou agredido e o debate se transformará em briga, disputa de ego, nada acrescentando ao esporte.
Espero ter conseguido me fazer entender.  Não sei muito bem como me saio ao colocar algum pensamento no papel (ou computador).  Quase sempre abro espaço para a má interpretação, já que escrever exige muito conhecimento gramatical, ortográfico e mesmo literário, sem falar aprofundamento sobre o assunto a tratar. Eu acho, de verdade, que não tenho numa medida suficiente estes qualificativos para gerar bons textos. Mesmo assim eu arrisco e este preâmbulo que fiz foi para esclarecer a quem possa ler estas linhas, de que nós temos que pensar um pouco mais além em tudo, mas muito mais quando o assunto for política e partidos políticos.  Algo que eu realmente gosto de debater.
Não canso de argumentar que a política é a grande condutora de nossos destinos e é o que garante que eu possa fazer isso ou aquilo, ter acesso a isso ou aquilo. É ela, a tão odiada política que define se vou ter emprego amanhã, ou se meus filhos poderão estudar no ano que vem.
Sobre isso tudo minha opinião sempre foi muito transparente e eu faço questão de deixar claro o que penso. 
Me julgo republicano.  Gosto de lutar ao lado de humanistas.  Sempre estarei perto de pessoas que defendem a liberdade, a minoração da distância entre pobres e ricos, e que busquem garantir boa educação, cultura, bem estar e direitos indiscutíveis inerentes a todas as pessoas, independente de sua condição.
Embora eu já tenha trocado de partidos políticos para sediar minhas lutas, sempre estive ao lado de companheiros e camaradas que carregavam estas bandeiras.  Dentro de mim, o mesmo sangue vermelho e o mesmo coração pulsante, batendo do lado esquerdo do peito. 
E enfrentei, claro, julgamentos e críticas, não de adversários políticos, mas dos companheiros e próximos.  Tenho maturidade para saber que nunca foi pessoal.  Estes críticos defendiam "o partido".
Este é o ponto.  Não nos enganemos.  Os estatutos e programas partidários, embora importantes balizadores, quase sempre estão sujeitos ao pragmatismo e quando não, aos interesses dos burocratas do partido.  Estar em um partido, usar seus símbolos ou cores, por si só, não garantirá a quem quer que seja, a salvaguarda daquilo que ali está grafado e bem escrito. 
Parece óbvio que o correto, ao invés de mudar de partido, seja fazer a disputa internamente no que seria um caminho a ser percorrido por militantes responsáveis.  Mas isso desde que uma briga, ainda maior, não fique à mercê do destino, lá fora.
Evidente que há diferenças gritantes entre estar no PSTU e PSDB.  Mas avaliemos o conjunto.
Primeiro, todos nós que gostamos de acompanhar a política em suas mais diversas formas, já vimos defensores de valores avançados em partidos ditos de direita e reacionários com profundo conservadorismo em partidos de esquerda. Aliás, ser contrário à mudanças, não perceber a necessidade de se alterar rotas e estratégias é sim uma posição conservadora e perigosa para quem milita no campo democrático.  Não condiz.
O partido político deve, ou deveria ser, o instrumento, não a finalidade da luta.  E muitas vezes, estar em outro partido, não anula a história de alguém que sempre esteve coerente com o partido de sua permanência anterior.
Antes da abertura, em 1985, muitos eram os militantes políticos dentro do MDB.  Ao acender das luzes e com a possibilidade de voltarem os registros partidários, boa parte seguiu seu rumo, criando "n" legendas para acomodar seus discursos.  Ressurgiram partidos históricos como PDT, PCB e PCdoB, que embora estivessem funcionando na clandestinidade, tinham seus membros mais atuantes com cadeiras entre os MDBistas.  Essa era uma acomodação necessária, justificada para garantir a luta de algum modo.
Mas veja.  Alguns dos militantes "mais puros" ficaram no seu templo partidário de origem, mesmo clandestinamente, com a velinha acesa mantendo vivo iluminado o altar só que com isso podem ter deixado de contribuir com o processo de abertura que permitiu seu partido voltar a ter espaço.  Não é cruel pensar assim?
Em nome da luta, podemos sim justificar algumas posturas.
Em cidades menores, também não é raro encontrarmos prefeitos do PT que governam ao lado do PSDB e vice-versa, ainda hoje, em coligações incompreensíveis para muitos.  Mesmo sem defender isso, eu fico aqui pensando como estas prefeituras estão sendo conduzidas e se isso não acabou sendo melhor que entregá-las a alguém de rapina, ou a algum "coronel" do sertão.  Talvez seja menos importante, de imediato, que aqueles petistas ou tucanos sejam conhecedores das defesas expressas nos manifestos de seu partido.
Recentemente, sofremos um golpe.  Sim, goste ou não goste, um golpe, versão já aceita até por pessoas que o defenderam no passado como se fosse uma ação democrática.  E o sofremos justamente pela falta desta visão "holística" do que seria a política por parte dos componentes da esquerda.  Enquanto no contexto imposto à opinião pública estava a polarização entre petralhas e coxinhas, ou partidários de Dilma e Aécio, dentro do campo da esquerda havia, pra complicar, a polarização entre PT e o resto da esquerda.  O primeiro o grande traidor e todos os demais, isentos de qualquer responsabilidade histórica.  Pronto.  Perdemos todos nós.
Com a saída de Dilma, a defesa de nossos postulados foi alijada, e bandeiras de cor semelhante, mas com símbolos diferentes, estiveram em posições opostas da batalha.  Lamentável e fatal para os parcos direitos conquistados pelos governos de Lula e Dilma, hoje jogados por terra, num prejuízo sem tamanho para toda a classe trabalhadora que deveria ser defendida pelos partidos que a representam.
Agora, um segundo golpe está em curso com a criminalização de Lula e seu afastamento do processo eleitoral, justamente para impedir a possível retomada.  E de novo, ao que me parece, petistas acreditam não precisar dos demais companheiros de cor avermelhada, enquanto camaradas defendem não precisar de Lula e sua popularidade para reerguer a classe trabalhadora, alçando-a novamente à frente das decisões.  Já não vimos este filme?
Visão turva, na minha opinião, de quem apenas faz da política um Fla x Flu, sem maiores consequências ou avaliações. 
Pensam como se estrelas, martelos, engrenagens fossem superiores ao ser humano que estes símbolos prometem representar.  Partidários da esquerda discutem ainda o flerte de seus membros no período de troca partidária, quando deveriam estar preocupados sim com algum projeto de união, de mescla, destas "esquerdas" todas.
Esse apego perigoso por um boton, não é tão diferente do apego à suástica, à estrela de David, à cruz ou a qualquer outro símbolo.  Estes brasões quando não empregados na amplitude de seus objetivos, distanciam e separam, enfraquecem e desviam do rumo ao invés de fortalecer, incluir, abranger e transformar.
Tenho visto isso de perto ao tentar unificar um pequeno grupo para debates em minha cidade.
Vivemos em uma área do Estado de São Paulo de pensamento predominantemente reacionário.  Portanto, chamar a todos os ditos de esquerda para um bate-papo, me parecia urgente.  Até tentei.
Mas há um claro confronto entre membros de partidos diferentes que se cobram, uns dos outros, por aquilo que estamos sofrendo hoje. Exigem uma coerência com a "grande questão", mas não abandonam sua "pequena questão" em prol dessa unidade. Objetivamente, o que fazem com essa desunião é dar guarida para que o campo adversário, sempre unido pelo menos em algumas questões, ocupe todos os espaços.  Não entendo, não aceito e não perdoo. É deste comportamento que nascem movimentos fascistoides capazes de grande destruição de consciências.
Imagine se houvesse uma grande assembléia em que representantes do PT, PSTU, PSOL, PCB, PCO, PCdoB e até PDT pudessem estar juntos, deixando seus bonés em casa, mas dispostos a um programa geral.  Que seus membros se confundissem no mesmo discurso e que todos, unidos aos movimentos sociais, resolvessem caminhar numa mesma direção. Podiam ter lutas pontuais como agregador, como exemplo, a defesa do direito de Lula concorrer.  Abraçando-o e o conduzindo ao Planalto para depois evitar que oportunistas de sempre se apoderem do mandato, ou de parte dele que seja, afim de promovermos as grandes conquistas que ficaram faltando para a classe trabalhadora. Seria ótimo, portanto, que ao invés de se agredir, estes companheiros e camaradas pudessem caminhar em uníssono.
Só que não, como dizem os meus filhos adolescentes.  Se alguém de um destes partidos resolve promover uma conversa destas é logo visto com desconfiança.
Se alguém do PT decide migrar para outro destes partidos, será logo chamado de oportunista já o partido parece, mas só parece, estar se dissolvendo.  Será visto como "traidor".  E se algo semelhante acontece a alguém do PCB que se filia ao PT, será igualmente tratado por traidor, pragmático, político de profissão e assim vai.  Falta-lhes, a todos estes, camaradas e companheiros, visão holística.
Deixam suas paixões se sobreporem ao próprio sonho, à própria causa.
Repito, Partido é instrumento e não finalidade da luta.
Estou assistindo, agora mesmo, ao julgamento de um companheiro que tenta empreender uma nova caminhada, refrigerado talvez por um pouco mais de fôlego e longe do estrangulamento provocado por burocratas de seu partido.  Vi com clareza então que a esquerda pode, às vezes, ser tão cruel quanto a direita.
Não se pode rasgar a história de alguém porque trocou de camisa, desde que sua luta continue a ser ou se manifeste como a luta por aquilo que coerentemente sempre defendeu.  Muito mais, não se pode chamar de oportunista quem troca um lugar "aparentemente" confortável de apreço e aliados, por outro onde tudo isso ainda precisará ser conquistado, sem questionar os motivos que o levaram a esta decisão.
Me diga, que diferença faz brigar aqui ou ali pelo mesmo resultado?
Se voltarmos ao dicotomismo, a análise ficará totalmente comprometida.
Não se trata de certo ou errado, bonito ou feio, ideal ou interesse.  Dá como estar num contexto mais ampliado.
Usando a religião por analogia, não nos parece horrível quando evangélicos extremistas invadem um terreiro a destruir-lhes os símbolos sagrados unicamente pela intolerância? E como podemos classificar quando muitos de nós tem afirmado que todo pastor explora seus fieis, ou que todo evangélico é alienado?  Há por certo, evangélicos e umbandistas com interesses comuns, simplesmente os de propagar, cada um ao seu modo, a paz, a fraternidade e o amor.  E se duvidar, andam juntos, dividindo os mesmos fiéis ou instrumentos musicais.
Não devemos, enfim confundir "campo" com "partido".  Deixemos que aqueles que não têm consciência política façam isso.  A nós cumpre não perder os sentidos, neste momento de nossa história.  Campo político é uma coisa.  Partido é outra.
Se não enxergarmos assim e não ampliarmos nosso raio de visão, corremos o sério risco de vermos derrotados todos os nossos anseios, pois como profetizava Cristo, já que apontei religiosidade aqui, "reino dividido não prosperará".



2 comentários:

  1. Comentário de quem sabe que entre o preto e branco nao existe apenas o cinza,mas um arco-íris !

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  2. Não creio na peregrinação entre os terrenos dos partidos de esquerda sem o pagamento de um pedágio cujo preço estará carregado de insatisfação. Aos mais próximos, aos amigos, aos correligionários, aos confidentes creio deveríamos ter um papo mais carregado de tolerância, sem ódio com linguajar exalando o incenso da amizade e disposição de apoio. Penso, desde o início do texto o esforço do companheiro Lula que procura manter o PT em pé com disposição de luta.

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