sábado, 21 de outubro de 2017

Contraditórios

I -

Estes dias me deparei com uma pergunta muito cruel:

"Não é incoerente um empresário se dizer comunista ou de esquerda?"

É sou empresário.  Tenho uma corretora de seguros que também é uma franqueadora, tenho uma intermediadora de negócios, que também é franqueadora, uma consultoria empresarial e uma empresa recém montada de atendimento assistencial. Todas com um sócio. Mas que fique bem claro: ser empresário não é sinônimo de ser rico ou ser acumulador.  Não sou rico, nem acumulador.  Que bom!

Eu tenho sempre muito cuidado em não transparecer perfeição, pois não sou perfeito e muito menos tenho esta pretensão.  Por isso também jamais me disse comunista, mesmo tendo participado da reorganização e depois dirigido o PCB em minha cidade.  Tenho aliás enorme simpatia por partidos de esquerda como PCO, PSTU, PSOL, PCdoB e sou, até o momento, filiado ao PT. É... me considero de esquerda.
Para mim, por exemplo, desigualdades sociais são injustas, inadmissíveis e nada cristãs.  As combato com veemência.  Acho abominável o analfabetismo e a desinformação sendo usados como meios de dominação. 
Penso que haverá um dia, no futuro, em que o Homem viverá  com mais dignidade, onde servir seja uma honra, uma prova de afeto e não mais uma necessidade ou obrigação. 
Acredito ainda que qualquer preconceito é desvio mental, problema a ser tratado como doença de fato.  Acho o mando, fruto de insegurança, de maldade irracional ou simplesmente falha de caráter.

Pois bem.  Como conciliar isso com minha atividade atual?

Moro em meio ao capitalismo, mas mesmo como empresário, tenho apenas salário fixo e mensal.  Jamais faço de possíveis lucros ou ganhos inesperados da corporação que ajudo a dirigir, uma nova forma de renda particular.  Em nossas empresas (digo nossas pois tenho sócio), há comissionamento para boa parte das pessoas, uma boa participação nos resultados para franqueados e outros envolvidos.  Do que sobra disto, empregamos imediatamente na própria manutenção do negócio para permitir sua continuidade e solidez.
Tentamos promover uma política de RH bastante humana, em que pese permanecer dentro do modelo corporativo vigente.  No entanto, os colaboradores podem atestar nossos procedimentos e modo de tratar a gestão de pessoal.

Respondo a pergunta cruel dizendo que há contradições piores.  Como ser, por exemplo, um proletário favorável às desigualdades, à meritocracia, contrário à política de cotas, a programas como Bolsa Família e a outras formas de minimizar as terríveis dívidas sociais acumuladas ao longo de anos sem fim.  Também é impróprio e contraditório ser, proletário ou não, e defender a repressão, o autoritarismo, a liberação de armas ou qualquer outra proposta que ameace a vida, limite as liberdades, restrinja o pensamento ou represente algum tipo de "mando" ou exploração.

II -

Com vontade de assistir a um filme em família, convidei minha mulher e meus filhos para irmos ao cinema neste sábado.  O filma, Tempestade, desaconselhável para menores de 12 anos.  Meu menorzinho tem 9.
Juntos, já vimos muitos filmes mais complicados e com idades de classificação mais altas.  Destaco gêneros como X-Man, Homem Aranha e alguns outros.  Assim, nem me preocupei com este fato.

Fomos ao shopping onde almoçamos e compramos, com boa antecedência, os ingressos nestas máquininhas que substituíram os bilheteiros.  Sem qualquer aviso adicional, a não ser o simples fato de mencionar a classificação do filme, imprimimos os papelotes e fomos fazer hora até a abertura da sala.

Daí veio a surpresa, meu filho não pôde entrar mesmo estando acompanhado por mim, minha mulher, além dos irmãos.  Tudo bem.  Posso aceitar que haja este tipo de cuidado.  Mas da noite para o dia, com 5 ingressos nas mãos, pipocas e refrigerantes, fomos barrados sem aviso prévio.  Claro que fiquei nervoso.  Mas sou ou não um pai responsável?

Procurei pela gerente do Cine Araújo do Rio Preto Shopping para tentar explicar e também assumir a responsabilidade.  Nada.  Nem os colaboradores do cinema a encontraram.  Eu queria apenas uma reparação ou justificativa.  Algo para me conformar com o prejuízo e a frustração.  Fiquei no vácuo.

O fato é que na noite anterior, ao assistir TV em casa, fomos surpreendidos com a notícia de que jovens haviam atirado em amigos no colégio em Goiânia.  Acho isso história pavorosa e que criança não devia ver.  Quanto seria a classificação de uma notícia destas?  16, 18, 21 ou 50 anos?  A mesma talvez que da notícia sobre o atentado de Las Vegas.

Aliás, novelas e outros programas, mesmo vespertinos, com certeza assustam mais, ou transmitem menos exemplos positivos que um filme sobre catástrofes naturais.

Acho extremamente contraditório que crianças tenham acesso livre nas escolas, celulares, computadores e televisão aberta, andando pelas ruas ou em qualquer outro lugar, nos quais possam ver notícias, apelos sexuais ou outras barbaridades e ao mesmo tempo, acompanhadas dos pais, em uma tarde de sábado, sejam privadas com tanta ênfase de algo menos grave como um filme destes.

É bem igual ao fato da "sociedade" brasileira se incomodar que um homem esteja nu em um museu, perto de crianças, mas não ligar a mínima que uma verdadeira pornografia, consubstanciada em um bacanal de propinas seja mostrada dia e noite a "céu aberto".  Moralismo seletivo?

III -

Acho incrível como as pessoas saíram fácil às ruas para protestar contra a corrupção neste país, após ter sido colocado, em suas mentes, que um governo que trabalhou durante 14 anos para os trabalhadores e menos favorecidos, poderia ter roubado ou promovido atos de corrupção.  Com razão ou não, afinal há 500 anos se rouba neste país,o que me causa espécie é notar que os "patriotas" de verde e amarelo agora se calam diante de um governo coberto de lama, de pura vergonha, escândalos, roubos, afrontas envolvendo gente graúda e de todos os partidos e poderes, sem falar nos desmandos e entreguismo.

Acho incrível como a imprensa trabalhou para derrubar Dilma e não atua da mesma maneira para derrubar uma quadrilha organizada, descarada e reprovada pela opinião pública que, embora não se movimente para a "degola", não deixa de estar atônita.

Acho ainda incrível ver como a polícia e a justiça agem ao prender um "pé de chinelos" em comparação como procedem ao prender um figurão, um colarinho branco destes aí.

E não é menos incrível, que bandidos ricos, poderosos e cheios de artimanhas, envolvidos com drogas e desvios de dinheiro para o exterior, continuem com mandato, gozem do direito da diminuição de suas penas por delações premiadas, cumpram pena domiciliar e tenham suas mulheres, filhas ou irmãs liberadas para cuidar de filhos ou viajar ao exterior, enquanto outros, sobretudo os delatados por estes, ficam à mercê da cadeia e do foco, merecendo ou não.

Indignação seletividade, moralismo desigual e justiça parcial.

IV -

Vi o mundo comemorando, dias atrás, a reeleição para mais um mandato da Chanceler Alemã Angela Merkel que completará seus 16 anos como chefe do governo daquele país.
Se Chavez, Maduro, Lula, Mojica, Cristina ou Evo passassem de 4 anos em seus mandatos, já eram  considerados ditadores, implantadores do comunismo, do bolivarianismo e por aí vai.

A análise da política internacional tem olhos diferenciados, né? 

Bem como quando a mídia internacional e líderes de algumas nações, trataram de uma forma o cruel atentado aos jornalistas franceses do jornal Charlie Hebdo e agora se limitam, quando muito a comentar o terrível atentado na Somália do domingo passado.  Sem passeatas, sem comoção e sem grandes documentários, a mídia pareceu não "sofrer" tanto para noticiar o fato.
Neste sentido, boa parte da opinião pública vai no embalo.  Ninguém mudou o perfil nas redes sociais ou acrescentou bandeirinhas coloridas no fundo de suas imagens.

Alemães e outros europeus de pele e olhos claros, parecem despertar mais comoção do que latino-americanos e africanos.  Coisas do humanismo contraditório.







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